Liberdade de Expressão

2004

  Mecanismos Internacionais para a Promoção da Liberdade de Expressão
DECLARAÇÃO CONJUNTA*

O Relator Especial das Nações Unidas sobre a Liberdade de Opinião e Expressão, o Representante da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa para a Liberdade dos Meios de Comunicação, e o Relator Especial da OEA para a Liberdade de Expressão,

Tendo discutido os presentes temas em Londres e de modo virtual com o apoio da organização ARTIGO 19, Campanha Mundial pela Liberdade de Expressão (ARTICLE 19, Global Campaign for Free Expression);
Recordando e reafirmando suas Declarações Conjuntas de 26 de novembro de 1999, 30 de novembro de 2000, 20 de novembro de 2001, 10 de dezembro de 2002, e 18 de dezembro de 2003;

Observando o reconhecimento cada vez maior do direito fundamental ao acesso à informação em poder das autoridades públicas (ao qual às vezes se faz referência como o direito à liberdade de informação), inclusive em pronunciamentos e declarações internacionais centrais;

Aplaudindo o fato de que um grande número de países, em todas as regiões do mundo, adotaram leis que reconhecem o direito de acesso à informação, e que o número desses países está aumentando a um ritmo constante;

Reconhecendo a importância fundamental do acesso à informação para a participação democrática, a prestação de contas pelos governos e o controle da corrupção, bem como para a dignidade pessoal e a eficiência nos negócios;

Condenando as tentativas de alguns governos de restringir o acesso à informação, negando-se a adotar leis de acesso à informação ou adotando leis que não estão em conformidade com as normas internacionais nesta área;

Sublinhando a necessidade de contar com ‘válvulas de segurança’ da informação, tais como a proteção dos denunciantes de irregularidades ("whistleblowers"), e a proteção dos meios de comunicação e outros atores que divulgam informações de interesse público;

Dando as boas vindas ao compromisso da Comissão Africana de Direitos Humanos e dos Povos de adotar um mecanismo regional para a promoção do direito à liberdade de expressão, e notando a necessidade de contar com mecanismos especializados para promover a liberdade de expressão em todas as regiões do mundo;

Adotam, em 6 de dezembro de 2004, a seguinte Declaração:

Sobre o Acesso à Informação

  • O direito de acesso à informação em poder das autoridades públicas é um direito humano fundamental que deve se aplicar em âmbito nacional por meio de uma legislação abrangente (por exemplo, as Leis de Liberdade de Acesso à Informação) com base no princípio de máxima divulgação, estabelecendo o pressuposto de que toda informação é acessível, sujeito somente a um restrito sistema de exceções.
  • As autoridades públicas devem ter a obrigação de publicar de forma pró-ativa, inclusive na ausência de um pedido, toda uma gama de informações de interesse público. Devem-se estabelecer sistemas para aumentar, ao longo do tempo, a quantidade de informações sujeitas a tal rotina de divulgação.
  • O acesso à informação é um direito dos cidadãos. Como resultado, o processo para acessar a informação deverá ser simples, rápido e gratuito ou de baixo custo.
  • O direito de acesso à informação deve estar sujeito a um sistema restrito de exceções cuidadosamente adaptadas para proteger os interesses públicos e privados preponderantes, incluindo a privacidade. As exceções se aplicarão somente quando existir o risco de dano substancial aos interesses protegidos, e quando esse dano for maior que o interesse público em geral de ter acesso à informação. O ônus de demonstrar que a informação está amparada pelo sistema de exceções deve recair sobre a autoridade pública que procure denegar o acesso à mesma.
  • As autoridades públicas devem ter a obrigação de cumprir padrões mínimos de gestão de arquivos. Devem-se estabelecer sistemas para promover padrões mais elevados com o passar do tempo.
  • Em caso de discrepâncias ou conflitos entre normas, a lei de acesso à informação deverá prevalecer sobre toda outra legislação.
  • Aqueles que solicitarem informações deverão ter a possibilidade de apelar qualquer denegação de divulgação de informações perante um órgão independente com plenos poderes para investigar e solucionar tais reclamações.
  • As autoridades nacionais devem adotar medidas ativas para lidar com a cultura do sigilo que ainda prevalece em muitos países dentro do setor público. Isso deve incluir o estabelecimento de punições para aqueles que deliberadamente obstruírem o acesso à informação. Também devem-se adotar medidas para promover uma ampla sensibilização pública sobre a lei de acesso à informação.
  • Devem-se adotar medidas, incluindo a alocação dos recursos e da atenção necessários, para assegurar a implementação eficaz da legislação sobre acesso à informação.

Sobre a Legislação que Regula o Sigilo

  • Devem-se adotar medidas imediatas a fim de revisar e, na medida necessária, derrogar ou modificar a legislação que restrinja o acesso à informação, para que ela se alinhe aos padrões internacionais nesta área, incluindo conforme refletido nesta Declaração Conjunta.
  • As autoridades públicas e funcionários públicos têm a responsabilidade exclusiva de proteger a confidencialidade da informação sigilosa legitimamente sob seu controle. Outros indivíduos, incluindo os jornalistas e representantes da sociedade civil, nunca devem estar sujeitos a punições pela publicação ou ulterior divulgação dessas informações, independentemente delas terem sido filtradas ou não, a não ser que tenham cometido fraude ou outro delito para obter as informações. As disposições do direito penal que não restringem as punições pela divulgação de segredos de Estado aos indivíduos oficialmente autorizados a manusear esses segredos devem ser derrogadas ou modificadas.
  • Certas informações podem ser legitimamente sigilosas por motivos de segurança nacional ou proteção de outros interesses preponderantes. Contudo, as leis que regulam o sigilo devem definir com exatidão o conceito de segurança nacional e especificar claramente os critérios que devem ser utilizados para determinar se certa informação pode ou não ser declarada como sigilosa, a fim de prevenir que se abuse da classificação "sigilosa" para evitar a divulgação de informações que são de interesse público. As leis que regulam o sigilo deverão especificar com clareza quais funcionários estão autorizados a classificar documentos como sigilosos, e também deverão estabelecer limites gerais a respeito do período de tempo durante o qual os documentos podem ser mantidos como sigilosos. Essas leis deverão estar sujeitas ao debate público.
  • Os denunciantes de irregularidades ("whistleblowers")são os indivíduos que dão a conhecer informações confidenciais ou sigilosas, apesar de terem a obrigação oficial, ou de outra natureza, de manter a confidencialidade ou o sigilo. Os denunciantes que divulgam informações sobre violações de leis, casos graves de má administração dos órgãos públicos, uma ameaça grave para a saúde, a segurança ou o meio ambiente, ou uma violação dos direitos humanos ou do direito humanitário deverão estar protegidos frente a punições legais, administrativas ou trabalhistas sempre que tenham atuado de "boa fé".

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Ambeyi Ligabo                                                                                                 
Relator Especial das Nações Unidas sobre a Liberdade de Opinião e Expressão

Miklos Haraszti
Representante da OSCE para a Liberdade dos Meios de Comunicação

Eduardo Bertoni
Relator Especial da OEA para a Liberdade de Expressão