Liberdade de Expressão

2007

Mecanismos Internacionais para a Promoção da Liberdade de Expressão

DECLARAÇÃO CONJUNTA SOBRE DIVERSIDADE NA RADIODIFUSÃO [1]

O Relator Especial das Nações Unidas sobre Liberdade de Opinião e de Expressão, o Representante da OSCE sobre Liberdade dos Meios de Comunicação, o Relator Especial da OEA sobre Liberdade de Expressão e a Relatora Especial da Comissão Africana de Direitos Humanos e dos Povos (CADHP) sobre Liberdade de Expressão e Acesso à Informação,

Tendo-se reunido com representantes de ONGs, membros da academia e outros especialistas em Amsterdam em 7 e 8 de dezembro de 2007, sob os auspícios da organização ARTIGO 19, Campanha Mundial pela Liberdade de Expressão (ARTICLE 19, Global Campaign for Free Expression), auxiliados pelo Instituto para o Direito da Informação (IViR), da Universidade de Amsterdam,

Recordando e reafirmando nossas Declarações Conjuntas de 26 de novembro de 1999, 30 de novembro de 2000, 20 de novembro de 2001, 10 de dezembro de 2002, 18 de dezembro de 2003, 6 de dezembro de 2004, 21 de dezembro de 2005, e 19 de dezembro de 2006;

Destacando a importância fundamental da diversidade nos meios de comunicação para o livre intercâmbio de informações e ideias na sociedade, em termos de dar voz e satisfazer tanto as necessidades de informação quanto outros interesses de todas e todos, em conformidade com a proteção proporcionada pelas garantias internacionais do direito à liberdade de expressão;

Conhecedores, em particular, da importância da diversidade para a democracia, a coesão social e a ampla participação no processo decisório;

Conscientes do potencial das novas tecnologias tanto para servir como veículos para a promoção da diversidade quanto para gerar novas ameaças à diversidade, incluindo as que resultam do hiato digital;

Enfatizando a natureza complexa da diversidade, que inclui a diversidade de meios de comunicação (tipos de meios) e de fontes (propriedade dos meios), assim como a diversidade de conteúdo (produtos dos meios);

Reconhecendo as diversas contribuições que diferentes tipos de meios de transmissão – comerciais, de serviço público e comunitários – bem como os meios de transmissão com diferentes alcances – local, nacional, regional e internacional – fazem à diversidade;

Notando que a indevida concentração na propriedade dos meios de comunicação, de forma direta ou indireta, e também o controle governamental sobre os mesmos, geram uma ameaça para a sua diversidade, além de outros riscos, como o de concentrar poder político nas mãos dos proprietários ou das elites governantes;

Enfatizando que os meios de radiodifusão independentes e de serviço público continuarão desempenhando um importante papel na promoção da diversidade no novo ambiente de transmissão digital, incluindo o seu papel singular em prover uma programação confiável, de alta qualidade e informativa;

Atentos ao potencial de ocorrência de abusos nos sistemas regulatórios para os meios de comunicação, em detrimento, entre outras coisas, da diversidade, em particular, onde os órgãos de controle não estiverem suficientemente protegidos contra interferências políticas ou de outra natureza;

Preocupados com o aumento na quantidade de ameaças à viabilidade do serviço público de radiodifusão em diferentes países, que minam a sua capacidade de realizar o seu potencial de contribuir à diversidade dos meios de comunicação, e também com o insucesso de muitos países em reconhecer a radiodifusão comunitária como um tipo diferente de radiodifusão;

Adotamos, em 12 de dezembro de 2007, a seguinte Declaração sobre a Promoção da Diversidade nos Meios de Comunicação de Radiodifusão:

Pontos Gerais

  • A regulação dos meios de comunicação para promover a diversidade, incluindo a governança dos meios de comunicação públicos, só é legítima se for efetuada por um órgão protegido contra interferências políticas ou de outras naturezas, em conformidade com os padrões internacionais de direitos humanos.
  • A educação pública ampla e outros esforços devem ser envidados na promoção da alfabetização midiática e para garantir que todos os membros da sociedade possam entender e se beneficiar das novas tecnologias, com vistas a superar o hiato digital.
  • A transparência deve ser a marca distintiva dos esforços de políticas públicas na área da radiodifusão. Isso deve se aplicar à regulação, à propriedade, aos arranjos de subsídios públicos e a outras iniciativas de políticas públicas.
  • As tecnologias de baixo custo que sejam amplamente acessíveis devem ser promovidas com vistas a garantir o amplo acesso às novas plataformas de comunicações. Devem-se explorar e promover as soluções tecnológicas para problemas tradicionais de acesso – inclusive em relação a deficiências auditivas ou visuais.
  • Devem-se adotar medidas para assegurar que a publicidade governamental não seja utilizada como um veículo de interferência política nos meios de comunicação.

Sobre a Diversidade de Meios

  • Deve-se alocar ‘espaço’ suficiente para usos de radiodifusão em diferentes plataformas comunicacionais para assegurar que, como um todo, o público possa receber uma gama de serviços diversificados de radiodifusão. Em termos de disseminação terrestre, seja ela analógica ou digital, isso implica em uma alocação apropriada de frequências para usos de radiodifusão.
  • Diferentes tipos de emissoras – comerciais, de serviço público e comunitárias – devem estar em condições de operar em todas as plataformas de distribuição disponíveis, e de ter acesso equitativo às mesmas. Medidas específicas para a promoção da diversidade podem incluir a reserva de frequências adequadas para diferentes tipos de emissoras, normas do tipo "must-carry", o requisito de que as tecnologias de distribuição e de recepção sejam complementares e interoperacionais, incluindo além das fronteiras nacionais, e o acesso não discriminatório a serviços de apoio, tais como os guias de programação eletrônica.
  • As considerações sobre o impacto do acesso aos meios de comunicação, e sobre diferentes tipos de emissoras, devem fazer parte do planejamento da transição da radiodifusão analógica para a digital. Isso requer um plano claro para a mudança, que promova a radiodifusão de interesse público, ao invés de restringi-la. Devem-se adotar medidas para assegurar que os custos da transição digital não restrinjam a capacidade de operação das emissoras comunitárias. Quando apropriado, deve-se considerar a reserva de uma parte do espectro para a transmissão analógica de rádio no médio prazo. Pelo menos uma parte do espectro liberado por meio do "dividendo digital" deve ser reservada para usos de radiodifusão.
  • O sistema efetivo menos intrusivo para a administração da radiodifusão deve ser usado, levando-se em consideração reduções no problema da escassez. A outorga de concessões – justificada para as ondas radioelétricas, enquanto um recurso público limitado – não é legítima no caso da transmissão por meio da internet.
  • No novo ambiente de radiodifusão, é necessário haver medidas especiais para proteger e preservar o serviço público de radiodifusão. O mandato das emissoras de serviço público deve ser claramente definido por lei e incluir, entre outras coisas, a contribuição para a diversidade, que deve ir além da oferta de diferentes tipos de programações, para incluir a tarefa de dar voz e atender as necessidades de informação de todos os setores da sociedade. Devem-se explorar mecanismos inovadores de financiamento para o serviço público de radiodifusão, que sejam suficientes para permitir o cumprimento do seu mandato de serviço público e garantidos de forma antecipada e plurianual, e que contem com ajustes indexados contra a inflação.
  • A radiodifusão comunitária deve ser reconhecida de modo explícito por lei como uma forma diferente de radiodifusão, deve se beneficiar de procedimentos justos e simples para a outorga de concessões, não deve ter que atender a critérios tecnológicos ou de outorga de concessões severos, deve se beneficiar de tarifas concessionárias, e deve ter acesso à publicidade.

Sobre a Diversidade de Fontes

  • Em reconhecimento à importância particular da diversidade dos meios de comunicação para a democracia, devem-se estabelecer medidas especiais, incluindo normas antimonopólio, para prevenir a concentração indevida da propriedade dos meios de comunicação ou a propriedade cruzada dos mesmos, tanto de forma horizontal quanto vertical. Essas medidas devem envolver requisitos rigorosos de transparência quanto à propriedade dos meios de comunicação em todos os níveis. Elas também devem envolver o monitoramento ativo, a consideração, quando aplicável, da concentração da propriedade no processo de outorga de concessões, a descrição prévia das principais combinações propostas, e a atribuição da autoridade para prevenir que tais combinações entrem em funcionamento.
  • Deve-se considerar a prestação do apoio, com base em critérios equitativos e objetivos, aplicados de modo não discriminatório, para aqueles que desejarem estabelecer novos meios de comunicação.

Sobre a Diversidade de Conteúdo

  • Podem-se usar ferramentas políticas para promover a diversidade de conteúdo entre os meios de comunicação e dentro dos mesmos, onde elas forem consistentes com as garantias internacionais de liberdade de expressão.
  • Deve-se considerar a prestação de apoio, com base em critérios equitativos e objetivos aplicados de modo não discriminatório, para a produção de conteúdos que façam uma contribuição relevante à diversidade. Isso pode incluir medidas para promover produtoras de conteúdo independentes, inclusive solicitando que as emissoras de serviço público comprem dessas produtoras uma cota mínima da sua programação.
  • Deve-se alcançar um equilíbrio apropriado entre a proteção de direitos autorais e direitos conexos, por um lado, e, por outro, a promoção da livre circulação de informações e ideias na sociedade, inclusive por meio de medidas que resultem no fortalecimento do domínio público.

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Ambeyi Ligabo 
Relator Especial da ONU sobre a Liberdade de Opinião e Expressão

Miklos Haraszti 
Representante da OSCE para a Liberdade dos Meios de Comunicação

Ignacio Alvarez 
Relator Especial da OEA para a Liberdade de Expressão

Faith Pansy Tlakula 
Relatora Especial da CADHP para Liberdade de Expressão e Acesso à Informação

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[1] Tradução da versão original redigida e aprovada em inglês. A expressão "Radiodifusão" ("Broadcasting") deve ser entendida de forma ampla, como a emissão de sinais no espaço radioelétrico, incluindo, entre outras formas, o rádio e a televisão.