Imprensa da CIDH
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Washington, D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) reitera a gravidade da crise de saúde causada pela pandemia do novo coronavírus (COVID-19) e insta os Estados da região a adotarem medidas urgentes e reforçadas para garantir os direitos das crianças e dos adolescentes. A pandemia tornou-se um grande desafio para todos e, em um hemisfério marcado por brechas de desigualdade, os efeitos nos direitos humanos têm impactos diferenciados nas pessoas em situações de maior vulnerabilidade, como o são crianças e adolescentes. A CIDH insta a priorizar interesse superior das crianças e adolescentes diante da pandemia, especialmente daqueles que não contam com cuidados parentais, que vivem em situação de rua, na pobreza, em centros de privação de liberdade e aqueles que estão em instituições de assistência.
A Comissão destaca que, no início da crise da saúde, pessoas acima de 60 anos e com comorbidades foram identificadas como as mais vulneráveis aos efeitos da doença respiratória, deixando a impressão equivocada de que crianças e adolescentes não estariam incluídos no chamado "grupo de risco”. No entanto, os dados dos boletins epidemiológicos indicam que as pessoas mais jovens podem ver sua saúde seriamente afetada. Os números atuais indicam que a incidência da doença entre as crianças é maior nas Américas. Enquanto em outras regiões a incidência de COVID-19 entre crianças é de cerca de 1,8%, na Argentina, Brasil, Honduras e Panamá, por exemplo, essa faixa etária representa uma média de 5% dos casos confirmados. No Brasil, nove crianças e adolescentes morreram como consequência da infecção pelo COVID-19. Embora a taxa de mortalidade seja baixa para esse grupo populacional, pesquisas científicas recentes indicam que a infecção pelo vírus pode ter sérias conseqüências para diferentes órgãos do corpo.
Adotadas para conter a pandemia, medidas para conter o vírus como isolamento social e quarentena, podem produzir danos específicos para as crianças e suas famílias, principalmente diante do confinamento prolongado em suas casas. A CIDH está particularmente preocupada com o contexto de violência doméstica, que pode ser acentuado neste período. De fato, seis em cada dez meninas e meninos nas Américas são criados com métodos violentos que incluem castigo físico e agressão psicológica, que podem piorar durante o período de isolamento. Países como Argentina (nas províncias de Jujuy, Formosa, Salta, Buenos Aires e Chaco), Brasil, Colômbia, México, Paraguai e Peru relataram um aumento nos relatos de violência intrafamiliar durante a quarentena.
Nesse sentido, a CIDH solicita que os Estados fortaleçam os sistemas de proteção e denúncia de abusos e/ou violência, incluindo meios telefônicos e on-line, bem como a implementação de campanhas de conscientização por meio da televisão, rádio e outras mídias. Os Estados devem agir com a devida diligência na prevenção, investigação e punição de violência e abuso intrafamiliar. Da mesma forma, os mecanismos de apoio psicossocial e pedagógico devem ser habilitados para famílias e crianças, especialmente para pessoas com deficiência ou que sofrem de doenças psicológicas. Por outro lado, os Estados devem considerar os efeitos dos estereótipos de gênero na distribuição de tarefas em casa, o que pode representar um maior impacto sobre os direitos de meninas e adolescentes. Além disso, os Estados devem prestar atenção especial às crianças privadas de cuidados parentais ou que não conseguem encontrar isolamento físico em uma casa, como crianças que vivem na rua.
O isolamento físico também impõe outros efeitos sobre os direitos e a Comissão está particularmente preocupada em garantir o direito à educação diante da suspensão das atividades escolares e do fechamento das escolas. A CIDH salienta que os Estados devem permitir às crianças continuar seus estudos, com os mecanismos que sua idade e nível de desenvolvimento exigem. Em particular, os Estados devem fornecer ferramentas e flexibilidade para que os responsáveis adultos realizem atividades com seus filhos, privilegiando o fortalecimento dos laços familiares, garantindo que meninas e meninos com algum tipo de deficiência possam acessar educação sem exclusões, por meio de sistemas de apoio, estratégias de comunicação e conteúdo acessível. A Comissão também destaca que, em muitos países da região, as escolas desempenham um papel importante na segurança alimentar das crianças.
A Comissão observa que a maioria dos Estados da região adotou medidas de educação a distância como forma de manter o acesso à educação. No entanto, embora a educação a distância seja uma ferramenta importante, essa é uma medida que não atende a todas as crianças da mesma forma, uma vez que o acesso a equipamentos de informática e à Internet não é universal nas Américas. Na América Latina, em particular, os dados de 2019 indicam que 33% da população não tem acesso à Internet. Diante dessa desigualdade digital, a Comissão recomenda que os Estados usem os distintos meios de comunicação para garantir o acesso à educação de todas as crianças sem nenhum tipo de discriminação. Além da necessidade de garantir que o aprendizado on-line não amplie as desigualdades existentes ou substitua a interação aluno-professor.
Em relação aos adolescentes privados de liberdade nos centros de justiça juvenil, a Comissão segue as recomendações feitas no comunicado de imprensa publicado em 31 de março sobre os direitos das pessoas privadas de liberdade no contexto da pandemia. Em particular, a CIDH reitera a necessidade de os Estados adotarem medidas para prevenir o contágio, reduzir a superlotação nas unidades e avaliar as medidas de privação de liberdade, privilegiando aquelas alternativas ao confinamento. A Comissão também adota como suas as diretrizes do Comitê dos Direitos da Criança de que os Estados devem fornecer às crianças que não podem ser libertadas os meios para manter contato regular com suas famílias, diante de medidas aplicadas para restringir as visitas. Embora essas medidas restritivas possam ser consideradas necessárias a curto prazo, se vigentes por longos períodos elas terão um efeito negativo acentuado nos adolescentes. Da mesma forma, os Estados devem prestar assistência a crianças e adolescentes com referentes adultos privados de liberdade, favorecendo medidas alternativas à prisão, sempre que possível, e garantindo o contato familiar por meios apropriados que cumpram as recomendações das autoridades sanitárias.
Por outro lado, a CIDH reitera sua preocupação com o maior grau de vulnerabilidade que as crianças enfrentam em contextos migratórios ou de deslocamento. A esse respeito, a Comissão reitera os Princípios Interamericanos sobre Direitos Humanos de todos os migrantes, refugiados, apátridas e vítimas de tráfico de seres humanos, no sentido de que qualquer política de migração e decisão administrativa ou judicial relacionada à entrada, permanência, detenção, expulsão ou deportação de uma criança ou adolescente ou qualquer ação do Estado considerada em relação a qualquer dos pais, cuidador principal ou responsável legal, incluindo medidas tomadas em relação ao status de migrante, devem priorizar a avaliação, determinação, consideração e proteção dos melhores interesses da criança ou adolescente envolvido. As situações que apresentam risco de separação familiar devem ser tratadas com absoluta prioridade, e todos os procedimentos de proteção devem ser adaptados às circunstâncias exigidas pelas meninas e meninos afetados, a fim de garantir acesso imediato e eficaz a informações e mecanismos de proteção pertinentes.
Por fim, a Comissão valoriza as medidas adotadas pelos Estados para garantir os direitos das crianças e dos adolescentes durante a pandemia. Em particular, a CIDH celebra a expansão na Argentina para todas as suas províncias das linhas diretas gratuitas de denúncia para crianças e adolescentes vítimas de violência durante o isolamento. Além disso, de acordo com as informações fornecidas pelo Estado argentino, estão isentas de cumprir o isolamento social obrigatório e preventivo aquelas pessoas que estão em situação de violência de gênero quando precisam solicitar assistência ou apresentar uma denúncia, bem como os estabelecimentos que devem prestar assistência a essas pessoas. Também se saúda a recomendação do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos do Brasil, que instruiu os municípios a considerar a Conselhos Tutelares (órgãos de proteção à criança) como essenciais, impedindo a suspensão de suas atividades durante a pandemia. Da mesma forma, a CIDH celebra o portal virtual habilitado pelo Governo do México para informar os às crianças sobre o COVID-19.
Em vista do exposto, a CIDH reafirma as recomendações 23, 61, 63 a 67 e 69 da Resolução nº 01/20, "Pandemia e direitos humanos nas Américas", e a fim de proteger os direitos das crianças e adolescentes contra Além da pandemia de COVID-19, a Comissão recomenda adicionalmente aos Estados:
1. Fortalecer a proteção de crianças e adolescentes, especialmente aqueles que não têm assistência familiar e que estão em instituições de assistência - e impedir a disseminação do COVID-19, implementando medidas que considerem suas particularidades como pessoas em estágio de crise. desenvolvimento e que atendam aos seus interesses o mais amplamente possível. A proteção deve, tanto quanto possível, garantir os laços familiares e comunitários.
2) Diante de situações de violência, recomenda-se adotar medidas para prevenir abusos, violência familiar, discriminação, abuso e exploração de crianças e ativar campanhas de conscientização e disseminação de números de telefone de denúncias, além de atuar com a devida diligência diante das denúncias feitas.
3) Possuir mecanismos que permitam às crianças continuar com o acesso à educação e com incentivos que sua idade e nível de desenvolvimento exijam. Os Estados devem garantir que meninas e meninos com algum tipo de deficiência possam acessar a educação on-line sem exclusão, por meio de sistemas de apoio, estratégias de comunicação e conteúdo acessível.
4) Promover rotinas de atividades para meninas, meninos e adolescentes, fornecendo ferramentas para que as famílias promovam atividades recreativas e jogos que lhes permitam momentos de recreação, a fim de garantir a saúde física, mental e emocional de crianças e adolescentes.
5) Ter mecanismos e procedimentos eficazes de acolhimento e assistência para a proteção abrangente dos direitos humanos das crianças em situações de mobilidade e deslocamento humano, com atenção especial aos seus melhores interesses, bem como empreender todos os esforços para impedir a separação familiar. e promover a sua reunificação.
6) Adotar medidas para garantir o direito à participação das crianças, oferecendo oportunidades para que suas opiniões sejam ouvidas e levadas em consideração nos processos de tomada de decisão sobre a pandemia. As crianças devem entender o que está acontecendo e sentir que participam das decisões que as afetam.
A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.
No. 090/20