A CIDH expressa preocupação com a expulsão de pessoas em situação de mobilidade humana no Chile e chama o Estado a respeitar o princípio de não devolução

29 de novembro de 2021

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Washington, D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) expressa sua preocupação com a expulsão de pessoas em contexto de mobilidade humana no Chile, incluindo pessoas com possíveis necessidades de proteção internacional; e urge o Estado a respeitar o princípio de não devolução de acordo com as normas e os parâmetros interamericanos, assim como a garantir o devido processo e o acesso a mecanismos de proteção efetivos nos procedimentos de expulsão ou deportação de pessoas em mobilidade.

Através dos seus diversos mecanismos de monitoramento, a CIDH acompanha a situação de pessoas em contexto de mobilidade humana nesse país; em especial, a implementação de procedimentos de expulsão que não contam com análise de possíveis necessidades de proteção internacional, reunificação familiar, ou interesse superior de crianças e adolescentes. Observa-se com preocupação que, em 4 de novembro de 2021, o Governo expulsou ao menos 120 pessoas provenientes da Colômbia e da Venezuela que, segundo informações públicas, incluem pessoas condenadas por delitos no Chile, assim como aquelas que ingressaram fora dos canais regulares de entrada no país, pela via administrativa. A CIDH observa que tais expulsões se somam a outras expulsões observadas pela CIDH durante o ano de 2021, inclusive expulsões administrativas.

Por sua vez, as organizações da sociedade civil afirmaram que antes da execução dos procedimentos administrativos de expulsão, as pessoas foram detidas e ficaram incomunicáveis. Ademais, como consequência desses procedimentos, foram reportados casos de separação familiar, bem como a falta de implementação de medidas para garantir o princípio da unidade familiar e da reunificação familiar. Afirmaram, além disso, que não estava sendo providenciado o acesso à assistência jurídica, nem à possibilidade de se apresentar recursos judiciais efetivos contra as ordens de expulsão. Também se referiram a casos nos quais foi ordenada a suspensão de ordens de expulsão quando as pessoas já tinham sido deportadas.

Nesse sentido, o Estado informou à CIDH que a grande maioria das ordens de expulsão das pessoas no voo de 4 de novembro de 2021 foi decidida por Tribunais de Justiças chilenos, e que teria contado com as garantias do devido processo. Também disse que não promove expulsões coletivas, e observa que não podem ser incluídas nessa categoria aquelas expulsões que se materializam de maneira plural, afirmando que cada uma das pessoas envolvidas teve um processo individual, devidamente tramitado e justificado, que findou com a sua expulsão. Quanto às expulsões administrativas, afirmou que existem casos nos quais as pessoas submetidas a esses procedimentos interpuseram recursos de amparo que deixaram sem efeito as ordens de expulsão.

Nesse contexto, a Comissão observa que vários escritórios especializados das Nações Unidas afirmaram que executar procedimentos de expulsão durante o fim de semana restringiria o acesso à justiça das pessoas afetadas por tais medidas. Também ressaltaram que todas as pessoas submetidas a uma medida de expulsão têm o direito a uma avaliação individual do seu caso, que inclua a determinação de necessidades de proteção internacional e o risco para sua vida, liberdade ou integridade. Agregaram que os processos de expulsão nos quais se misturam tanto pessoas com ordens de expulsão administrativas como judiciais requerem um protocolo de gestão diferenciado. Ainda afirmaram que a combinação de perfis pode produzir um aumento nas manifestações de xenofobia e discriminação nas comunidades de acolhimento, ao associar as pessoas expulsas por faltas administrativas à prática de delitos.

No mesmo sentido, em suas Observações finais sobre o segundo relatório periódico do Chile de 11 de maio de 2021, o Comitê de Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migratórios e de seus Familiares (CMW) expressou sua preocupação com: 1) o que considera um alto número de expulsões coletivas; 2) a impossibilidade material de se interpor recurso para evitar a expulsão; 3) o prazo no qual estão sendo executadas não garante o direito ao devido processo nem à adequada proteção consular, e 4) a utilização de expedientes como a autodenúncia para viabilizar expulsões administrativas sem informações adequadas das pessoas migrantes e solicitantes de asilo. Além disso, o CMW afirmou que as resoluções que ordenavam deportações apresentavam o mesmo texto, mudando unicamente o nome da pessoa, data e local de ingresso, o que comprova que não foi feita uma análise individualizada. Do mesmo modo, o Relator Especial sobre os Direitos Humanos dos Migrantes, o Relator Especial sobre os Direitos Humanos dos Migrantes, o Relator Especial sobre a tortura e outros maus tratos, e o Grupo de Trabalho sobre a Detenção Arbitrária instaram o Estado a interromper imediatamente os processos de expulsões coletivas de pessoas migrantes. A esse respeito, a CIDH expressa preocupação com o risco de violação dos princípios do devido processo, com obstáculos de acesso aos mecanismos de proteção e com as consequentes violações do princípio de não devolução, representadas pela ampliação da prática das chamadas expulsões administrativas.

A CIDH lembra que conforme o assinalado na Resolução 4/19 sobre os Princípios Interamericanos sobre os Direitos Humanos de todas as Pessoas Migrantes, Refugiadas, Apátridas e as Vítimas do Tráfico de Pessoas, o Estado deve respeitar o princípio de não devolução, incluindo a proibição da rejeição na fronteira, relativa a toda pessoa que busca asilo ou outra forma de proteção internacional. Além disso, destaca que nenhuma pessoa pode ser expulsa, devolvida, extraditada, trasladada de maneira informal ou entregue, de modo nenhum, colocada nas fronteiras de outro país, seja ou não da sua nacionalidade, onde sua vida ou liberdade corram perigo ou onde possa ser submetida à tortura, tratamentos ou penas cruéis, inumanas ou degradantes.

Ainda, a Corte Interamericana de Direitos Humanos, em sua Opinião Consultiva 21/14 afirmou que o princípio de não devolução, estabelecido no artigo 22.8 da Convenção Americana, protege toda a pessoa estrangeira, não somente as que solicitam asilo e refúgio. Além do que, derivado da proibição da tortura, dito princípio é absoluto e adquire o caráter de norma imperativa de direito internacional consuetudinário, ou seja, de jus cogens. Também, na  Opinião Consultiva 25/18 destaca que tal princípio é, igualmente, garantia de diversos direitos humanos inderrogáveis; isso, devido à sua finalidade, que é a de preservar a vida, a liberdade ou a integridade da pessoa.

Em relação aos procedimentos de expulsão ou deportação, a Comissão lembra que eles devem se organizar em torno a uma decisão individual, com especial atenção às necessidades de proteção internacional; e que a expulsão ou deportação coletiva é manifestamente contrária ao direito internacional e às garantias do devido processo quando as pessoas migrantes são privadas do direito de serem ouvidas, de se defenderem adequadamente e de impugnarem sua expulsão ou deportação. Também destaca o dever de garantir a suspensão da decisão de expulsão ou deportação enquanto o trâmite de algum recurso continue pendente. Em acréscimo, em sua Resolução 2/18 sobre Migração Forçada de Pessoas Venezuelanas, a Comissão ressaltou a necessidade de se respeitar o princípio e o direito à não devolução ao território venezuelano, seja através de procedimentos de deportação ou expulsão seja de qualquer outra ação das autoridades, de pessoas venezuelanas que estejam em risco de perseguição ou de outras graves violações aos seus direitos.

Finalmente, em seu relatório Devido processo nos procedimentos para a determinação da condição de pessoa refugiada, e apátrida e a concessão de proteção complementar,a CIDH recomendou, entre outras coisas, garantir o acesso aos territórios e aos procedimentos de proteção de maneira eficaz, assim como adotar medidas para adaptar as estruturas e instituições já existentes, dotando-as de capacidades para processar e decidir, de maneira adequada e com respeito ao devido processo, a situação dos fluxos massivos de pessoas solicitantes de asilo, refúgio e outras formas de proteção humanitária no contexto dos atuais movimentos migratórios mistos na região.

A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.

No. 318/21

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