A CIDH expressa sua preocupação diante da entrada em vigor das reformas legislativas que têm um impacto regressivo no exercício do direito ao protesto em Honduras

16 de novembro de 2021

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Washington, D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e sua Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão (RELE) alertam para o impacto regressivo no exercício dos direitos humanos diante da entrada em vigor de reformas realizadas no Código Penal e na Lei Especial de Lavagem de Dinheiro em Honduras, que, por sua formulação, podem afetar o direito ao protesto, e chamam o Estado a assegurar que a normativa se adeque aos parâmetros interamericanos.

No dia 1 de novembro, o Congresso Nacional de Honduras publicou no Diário Oficial "La Gaceta" diversas alterações no Código Penal e na Lei de Lavagem de Dinheiro de Honduras, entre outros marcos normativos, que foram aprovadas por meio do Decreto 93/21 de 7 de outubro de 2021.

Na reforma do Código Penal foi incorporada a figura da "detenção do espaço público", como uma modalidade do delito de usurpação. O artigo 378, inciso 4, sanciona com penas de prisão quem "detenha o solo ou espaço correspondente ao direito de uso de bens públicos como o direito de passagem, estrada, rua, jardim, parque, área verde, passeio ou outros lugares de uso ou domínio público(...)" com a finalidade de impedir que uma pessoa "possa desenvolver ou continuar o exercício do seu trabalho, afetando o normal desenvolvimento das suas atividades e direitos". Além disso, chama atenção para o fato de que a mudança operada quanto ao crime de usurpação previa a figura do flagrante continuado, que torna possível a aplicação de processos mais céleres, incrementa a pena e adiciona agravantes; e a figura do desalojamento preventivo, sem ordem judicial.

Para a CIDH e a RELE tais reformas poderiam resultar em restrições ilegítimas à liberdade de expressão e de reunião pacífica ao limitar o exercício de protestos em espaços públicos, assim como propiciar a criminalização de pessoas defensoras. Além disso, preocupa que a falta de inclusão da intencionalidade requerida para a prática do delito possa propiciar a discricionariedade de pessoas operadoras do sistema de justiça e gerar um uso indevido desse tipo penal. Anteriormente, a CIDH havia expressado sua preocupação diante das reformas realizadas em 2019, e que entraram em vigor em junho de 2020.

A CIDH e sua Relatoria lembram que os Estados estão obrigados a garantir e facilitar o exercício dos direitos humanos em contextos de manifestações sociais, e não os impedir. Também lembram que a aplicação do direito penal pela participação em protestos constitui uma grave restrição ao direito à liberdade de expressão, que resulta, em princípio, inadmissível em face dos parâmetros interamericanos. Por sua vez, os Estados devem limitar a execução de desalojamentos forçados, pois são considerados, "em princípio" (prima facie) incompatíveis com o direito internacional; e estão obrigados a adotar medidas para proteger as pessoas e as comunidades prejudicadas por tais operações, tal como se afirma no relatório sobre protestos sociais e direitos humanos.

Por sua vez, a CIDH lembra que, no relatório sobre a Situação de Direitos Humanos em Honduras em 2019, expressou sua preocupação sobre o uso indevido do crime de usurpação, principalmente em prejuízo dos que defendem o direito à terra e ao meio ambiente. Além disso, por meio do comunicado de imprensa 191/21, ressaltou a continuidade do uso indevido do direito penal como prática de assédio contra pessoas defensoras, em especial por meio de processos penais pelo crime de usurpação de terras. Quanto a isso, o Estado informou sobre ações realizadas em conjunto com o Escritório da Alta Comissária para os Direitos Humanos e com a CIDH no âmbito da Mesa Especial de Assessoria Técnica (MESAT) em matéria de capacitação de pessoas operadoras do sistema de justiça em parâmetros internacionais relacionados com a prevenção, proteção e investigação de atos de violência contra pessoas defensoras de direitos humanos.

Por outro lado, de acordo com informações públicas, as reformas à Lei de Lavagem de Dinheiro incluem a incorporação da figura das Pessoas Expostas Politicamente (PEP), dentro da qual se encontrariam as organizações da sociedade civil que administram fundos de cooperação externa, que se dedicam a executar projetos ou programas de diferentes tipos, e à supervisão, investigação, avaliação ou análise da gestão pública. Tal inclusão poderia gerar uma restrição desproporcional para se obter cooperação financeira internacional para o desenvolvimento das atividades, ao existir a possibilidade de se aplicar o conceito de "não gestão de riscos". Organizações da sociedade civil afirmaram que essa legislação teria como finalidade obstruir os canais institucionais para investigar irregularidades governamentais e abusos contra a autoridade, propiciando a opacidade e a cultura do segredo.

A CIDH e sua RELE ressaltam que o direito a receber fundos internacionais no âmbito da cooperação internacional para a defesa e promoção dos direitos humanos está protegido pela liberdade de associação e o Estado está obrigado a respeitar sem impor restrições além das permitidas pelo direito à liberdade de associação. Por sua vez, lembram que o livre e pleno gozo da liberdade de associação impõe aos Estados o dever de criar as condições legais e fáticas através das quais as pessoas defensoras, os meios de comunicação e jornalistas possam exercer livremente o seu trabalho. Nesse sentido, ainda que a obrigação de garantir o direito de associação não impeça regulamentar a inscrição, vigilância e controle de organizações dentro das suas jurisdições, deve se assegurar que os requisitos legais não impeçam, retardem ou limitem a criação ou funcionamento dessas organizações.

Finalmente, preocupa à CIDH e sua Relatoria o contexto célere de aprovação das reformas no âmbito legislativo. De acordo com as informações recebidas, o Congresso Nacional sancionou tais normas em uma sessão virtual realizada no dia 7 de outubro de 2021, convocada somente algumas horas antes da sua realização e no contexto de um dos principais dias festivos de Honduras.

A CIDH e sua Relatoria lembram que o princípio da legalidade exige que as legislações que restringem o exercício de direitos fundamentais sejam adotadas formalmente por lei, tanto formal como materialmente, e que contem com as condições indispensáveis de deliberação pública. Nessa linha, a Corte Interamericana sustentou que "a proteção dos direitos humanos requer que os atos estatais que os afetem de maneira fundamental não fiquem ao arbítrio do poder público, mas sim cercados de um conjunto de garantias voltadas a assegurar que não se violem os atributos invioláveis da pessoa". A CIDH e sua RELE observam que a aprovação das mencionadas normas não contou com as mínimas condições de garantia da pluralidade de vozes, do escrutínio e do debate público que uma reforma desse tipo requer no Congresso Nacional.

Em atenção às considerações acima, a CIDH e sua RELE chamam o Estado a rever as reformas para que se adequem aos parâmetros e compromissos internacionais de direitos humanos. Em especial, garantir que o direito penal não seja utilizado como meio para restringir o exercício da liberdade de reunião pacífica, assim como para limitar o trabalho de pessoas defensoras e jornalistas.

A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.

No. 304/21

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