[enlaces U aquí]
Imprensa da CIDH
Washington D.C. - A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) reitera sua preocupação com a tese jurídica do "marco temporal" e adverte que esta poderia ter sérios efeitos sobre o direito de propriedade coletiva dos povos indígenas e tribais do Brasil. Em virtude do anterior, a Comissão lembra os parâmetros interamericanos aplicáveis ao assunto no marco dos processos judiciais em andamento.
Em sua última visita ao Brasil, a Comissão tomou conhecimento do desenvolvimento e aplicação da tese jurídica conhecida como o "marco temporal" pelo STF. De acordo com esta abordagem, nas reivindicações relativas ao direito de propriedade coletiva, os povos indígenas só teriam direito aos territórios ocupados na época da promulgação da Constituição Federal de 1988.
Em seu recente relatório Situação dos direitos humanos no Brasil, a CIDH destacou que esta tese tem sido aplicada pelos tribunais federais em várias decisões, levando ao cancelamento dos processos de demarcação. Em particular, a Comissão destacou os casos das terras Limão Verde e Buritim do povo Terena, assim como a terra Guyraroká do povo Guarani Kaiowá, todos no estado do Mato Grosso do Sul. A Comissão também observou que, em 2018, o STF aplicou a tese do marco temporal em relação ao território indígena Guyraroká, anulando processos de demarcação iniciados através de um relatório de identificação e delimitação de 25 de novembro de 2004. Neste último caso, a Comissão recebeu informações durante sua visita de 2019 de que a comunidade permanece fora da maior parte de seu território, ocupando atualmente menos de 5% da área identificada, com o risco iminente de despejo.
A respeito, a CIDH reafirma que a aplicação desta tese contradiz as normas internacionais e interamericanas de direitos humanos, em particular a Convenção Americana sobre Direitos Humanos e a Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas. Em particular, porque não leva em consideração os inúmeros casos em que os povos indígenas foram deslocados à força de seus territórios, muitas vezes com extrema violência, razão pela qual não estavam ocupando seus territórios em 1988.
A CIDH lembra ao Estado o seu dever de proteger o vínculo que os povos indígenas e comunidades tradicionais ou tribais de origem africana, como os quilombolas, têm com suas terras e territórios, assim como com os recursos naturais e elementos incorpóreos que deles derivam. Como a Corte Interamericana apontou, precisamente devido a esta conexão intrínseca que os povos indígenas e comunidades tribais têm com seu território, a proteção do direito de propriedade coletiva, uso e desfrute sobre ele, é necessária para garantir sua sobrevivência. Além disso, a CIDH lembra que a Corte estabeleceu que os povos indígenas e tribais que perdem a posse total ou parcial de seus territórios mantêm seus direitos de propriedade, sem limite de tempo, enquanto subsistir sua relação fundamental com seu território ancestral.
Portanto, a Comissão Interamericana chama o Estado do Brasil, em particular o Supremo Tribunal Federal, a adotar as medidas necessárias para rever e modificar as disposições das ordens ou diretrizes judiciais, tais como a tese de "marco temporal", que são incompatíveis com os parâmetros e obrigações internacionais relativas aos direitos humanos dos povos indígenas e tribais. Ao mesmo tempo, lembra o Estado de garantir o direito à consulta e ao consentimento livre, prévio e informado de forma eficaz e oportuna.
A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato decorre da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem o mandato de promover a observância dos direitos humanos na região e de atuar como órgão consultivo da OEA nesta matéria. A CIDH é composta por sete membros independentes eleitos pela Assembléia Geral da OEA a título pessoal, e não representam seus países de origem ou residência.
No. 219/21
3:52 PM