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Washington, D.C./ Montevidéu – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) realizou uma visita de trabalho ao Uruguai, entre os dias 27 e 29 de maio de 2019, com o objetivo de obter informações relativas à situação dos direitos humanos no país, em particular sobre a situação do tema de memória, verdade e justiça; pessoas privadas de liberdade; crianças e adolescentes; assim como os direitos das mulheres e das pessoas LGBTI. A delegação foi formada pela Comissária Esmeralda Arosemena de Troitiño, Presidenta da CIDH e Relatora sobre os Direitos da Infância, pela Comissária Antonia Urrejola Noguera, Relatora de País sobre o Uruguai, e por especialistas da Secretaria Executiva da CIDH.
A Comissão reconhece a importante liderança da República Oriental do Uruguai na consolidação da independência e autonomia do Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Ao mesmo tempo, agradece o Estado por toda a assistência oferecida para a organização e realização da visita, assim como a abertura e o apoio das autoridades desde o mais alto escalão para tratar dos temas de interesse da CIDH. Além disso, a Comissão agradece o esforço de representantes de organizações da sociedade civil, jornalistas, pessoas defensoras dos direitos humanos e vítimas de violações de direitos humanos e seus familiares para apresentar informações e testemunhos à Comissão.
No marco desta visita, a Comissão Interamericana realizou reuniões de trabalho com diversas instituições do Estado, incluindo encontros com autoridades dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário; com representantes de organizações da sociedade civil; com setores acadêmicos do Uruguai; e com pessoas vítimas de violações de seus direitos humanos.
Por ocasião da visita, a CIDH participou do seminário organizado pelo Estado uruguaio em cumprimento do acordo de solução amistosa assinado no caso David Rabinovich (Petição No. 1224-07). O seminário foi realizado com a finalidade de difundir os fatos do caso, promover o mecanismo de solução amistosa e os parâmetros interamericanos em matéria de liberdade de expressão e acesso à informação pública como medida de não repetição. O evento contou com a participação de diversos atores relevantes na proteção do direito à liberdade de expressão e do acesso à informação. A Comissão valoriza a abertura das partes para alcançar um acordo de solução amistosa neste caso tão importante.
Como indicado pela CIDH no seu Relatório Anual 2018, o Uruguai continua sendo um dos países mais sólidos em matéria de institucionalidade de direitos humanos na região. Neste sentido, a Comissão reconhece os avanços empreendidos pelo Estado mediante a criação da Instituição Nacional de Direitos Humanos e Ouvidoria (INDDHH); formação da Comissão pela Verdade e Justiça, instalação da Promotoria Especializada em Crimes de Lesa Humanidade; e a criação de espaços de memória. Além disso, valoriza a promulgação de leis de proteção e reconhecimento de direitos de idosos e pessoas LGBTI.
Em relação à garantia dos direitos de crianças e adolescentes, a Comissão toma nota com satisfação das políticas públicas implementadas pelo Estado para enfrentar o recente aumento dos casos de violência e maltrato infantil. Sobre o tema, a CIDH foi informada da elaboração de um protocolo de atenção às situações de violência sexual contra crianças e adolescentes, além da adoção de mudanças legislativas para prevenir a sua revitimização no marco de processos judiciais. A Comissão também recebeu informações sobre as iniciativas do Estado que buscam o empoderamento de meninas e adolescentes a partir de uma perspectiva de gênero para a prevenção da violência. Adicionalmente, a CIDH valoriza as ações de participação de crianças e adolescentes promovidas pelo Estado, em cumprimento dos parâmetros internacionais sobre o direito do menino e da menina de serem ouvidos e que suas opiniões sejam consideradas nas decisões que lhes atingem. Segundo a Presidenta da CIDH e Relatora para os Direitos da infância, Comissária Esmeralda Arosemena de Troitiño, “Os esforços do Estado no sentido de institucionalizar um sistema de proteção integral dos direitos de crianças e adolescentes são valiosos, porém é importante que o sistema conte com uma entidade reitora do mais alto escalão e que todos os atores que fazem parte dela estejam efetivamente articulados.”
Durante a visita de trabalho, a Comissão fez uma visita a um centro de cumprimento de medidas socioeducativas de privação de liberdade de adolescentes, e constatou que sua infraestrutura mantinha o caráter carcerário e não contava com condições adequadas para a custódia de adolescentes. Por outro lado, a Comissão ficou satisfeita com a intenção do Estado de substituir as unidades atuais por novas em modelo estruturalmente adequado e também a adoção de um Plano de Trabalho 2020-2025 que prioriza o cumprimento de recomendações de órgãos de monitoramento, além da adequação do sistema de aplicação de medidas socioeducativas aos parâmetros internacionais correspondentes.
A Comissão destaca os avanços observados sobre os direitos das pessoas privadas de liberdade, especialmente em relação ao uso da prisão preventiva. No entanto, a CIDH insta o Estado a continuar diminuindo as cifras, recordando que a prisão preventiva é uma medida excepcional. A CIDH também recebeu informações sobre a necessidade de melhorar as condições de detenção dos presídios, assim como a necessidade de criar uma política integral de medidas alternativas. Nesse sentido, a Comissão faz um chamado ao Estado para continuar avançando em matéria de direitos das pessoas privadas de liberdade, a fim de garantir seus direitos conforme os parâmetros internacionais sobre a matéria.
A Comissão toma nota e felicita o importante esforço empreendido pelo Estado na investigação e punição dos casos de violência de gênero no Uruguai. Nesse sentido, a CIDH destaca que, em 2018, foi emitida a primeira sentença aplicando a agravante de “feminicídio” no caso do assassinato de Valentina Walter, uma menina de 9 anos de idade. A sentença estabelece como motivação o ódio, desprezo ou menosprezo devido à condição de mulher da criança. No entanto, a Comissão ressalta a alarmante informação de que a violência doméstica é o crime mais frequente no país, atrás apenas do furto. A respeito disso, a Comissão insta o Estado a continuar avançando para reduzir e erradicar a violência de gênero através do investimento de recursos adequados para reforçar os serviços de atenção aos casos de violência, assim como a tomar medidas preventivas e fornecer uma educação que tenha perspectiva de gênero.
Sobre os direitos das pessoas LGBTI, a CIDH destaca os importantes avanços em relação ao reconhecimento da identidade e/ou expressão de gênero no Uruguai por meio da promulgação da Lei Integral para Pessoas Trans, que garantiu o direito à identidade de gênero baseada nos parâmetros interamericanos, assim como a criação de uma categoria de identidade de gênero no censo nacional e a reparação a vítimas de perseguição estatal baseada na identidade de gênero no período da ditadura. No entanto, a Comissão tomou conhecimento da informação preocupante de que o Tribunal Eleitoral aprovou um pré-referendo para revogar essa lei. Em relação a isso, a Comissão reconhece o grande valor democrático dos referendos e plebiscitos. Por outro lado, a CIDH reitera que a identidade de gênero é um elemento essencial do direito humano à personalidade jurídica e identidade das pessoas. A CIDH preocupa-se com a eventualidade de que um direito humano seja objeto de mecanismo de consulta popular.
Em matéria de memória, verdade e justiça, a CIDH observa com grande preocupação que, apesar dos esforços realizados pelo Estado, subsistam interpretações judiciais em ações penais que negam a imprescritibilidade das graves violações de direitos humanos no período da ditadura cívico-militar. Essas interpretações resultam na impunidade aos perpetradores dos crimes contra a humanidade e negam justiça e reparação às vítimas. A respeito disso, a Comissão recorda o Estado sobre sua obrigação de cumprir integralmente a sentença da Corte Interamericana no caso Gelman vs. Uruguai, que estabeleceu que “não são admissíveis as disposições de anistia, as disposições de prescrição e o estabelecimento de excludentes de culpabilidade que pretendam impedir a investigação e punição dos responsáveis pelas graves violações dos direitos humanos tais como tortura, execuções sumárias, extrajudiciais ou arbitrárias, e desaparecimentos forçados, todas elas proibidas por infringir direitos inderrogáveis reconhecidos pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos.” Consequentemente, a Comissão faz um chamado ao Estado, especialmente ao Poder Judiciário, para cumprir o seu dever de aplicação do controle de convencionalidade no marco de sua obrigação de respeitar e garantir os direitos humanos previstos nas decisões da Corte Interamericana e na Convenção Americana. A Comissão ressalta que subsiste uma dívida do Estado com todas as vítimas das violações de direitos humanos em matéria de justiça e verdade. Segundo a Comissária Antonia Urrejola, Relatora para o Uruguai e para a Memória, Verdade e Justiça, “durante a visita, foi particularmente doloroso conhecer os testemunhos das mulheres vítimas de violência sexual durante esse período.”
Em relação com as reparações estabelecidas por lei para as vítimas da atuação ilegítima do Estado, a CIDH recorda que, de acordo com os parâmetros interamericanos, estas reparações obedecem sua qualidade de vítimas das graves violações aos direitos humanos pelas quais o Estado é responsável. Estas reparações não são incompatíveis, nem substituem a renda própria, nem subsídios ou pensões da previdência social. Portanto, o Estado deve adotar as medidas necessárias para adequar sua legislação interna para permitir adequadamente este aspecto de reparação das vítimas.
Por outro lado, a Comissão toma nota e agradece a informação proporcionada pelo Estado sobre os avanços nas investigações sobre identificação e punição dos responsáveis pelas ameaças do grupo autodenominado “Comando Barneix” contra autoridades, operadores de justiça e pessoas defensoras de direitos humanos que trabalharam em processos judiciais relativos a violações de direitos humanos ocorridas durante a ditadura no Uruguai. A CIDH urge que o Estado continue investindo todos os esforços para determinar e punir os responsáveis. A Comissão expressa o seu reconhecimento sobre o admirável trabalho de defensoras e defensores de direitos humanos para conferir efetividade aos direitos humanos na região e, portanto, reitera que essas ameaças devem ser esclarecidas.
A Comissão agradece as autoridades do Estado, organizações da sociedade civil, agências internacionais e o povo uruguaio por sua colaboração na realização desta visita. Os insumos recebidos serão importantes para fortalecer o trabalho da CIDH não apenas no Uruguai, mas também na região. Além disso, a presente visita de trabalho foi realizada graças ao valioso apoio do Governo do Canadá, no marco do projeto “Combatendo a discriminação e a violência contra as mulheres, meninas e adolescentes na América Latina e no Caribe.” A CIDH continuará dando seguimento aos esforços do Estado no cumprimento de seus compromissos internacionais em matéria de direitos humanos.
A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.
No. 135/19