Imprensa da CIDH
Washington, D.C. - A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) enviou à Corte Interamericana de Direitos Humanos, em 3 de junho de 2023, o caso 13.752 de Celia Edith Ramos Durand, que faleceu em razão de uma esterilização à qual foi submetida sem o seu consentimento, como parte do Programa Nacional de Saúde Reprodutiva e Planejamento Familiar (PNSRPF).
Ramos Durand residia no Casario La Legua, Catacaos em Piura, no Peru, onde operava o PNSRPF, que promovia a anticoncepção cirúrgica. Em 3 de julho de 1997, Ramos Durand foi submetida a essa intervenção e teve complicações médicas que resultaram na sua morte. Neste mesmo dia, a equipe médica do Ministério da Saúde do Casario La Legua esterilizou quinze mulheres.
A investigação dos fatos foi arquivada em diversas ocasiões. Em 2002, um congressista encaminhou o caso à Procuradoria Especializada em Crimes contra os Direitos Humanos, porém em maio de 2009 o caso foi arquivado, devido à prescrição do crime. Em outubro de 2011, a Procuradoria da Nação reabriu a investigação contra ex-ministros da saúde e outros funcionários, ampliando para incluir Alberto Fujimori, por considerar que os crimes constituíam graves violações de direitos humanos e crimes de lesa humanidade.
Após diversas instâncias judiciais, em abril de 2018, a Terceira Procuradoria Superior Penal Nacional de Lima ordenou a formalização da denúncia contra Alberto Fujimori e outros como mandantes dos crimes de lesões corporais seguidas de morte, incluindo o caso de Celia Edith Ramos Durand.
Em seu relatório de mérito, a CIDH avaliou se o Estado peruano havia ou não cumprido com as suas obrigações quanto à regulação e à fiscalização do programa de esterilizações, à obtenção do consentimento informado e às condições adequadas para realizar o procedimento médico. A CIDH concluiu que o Estado peruano descumpriu todas essas obrigações.
Quanto à regulação e à fiscalização do programa, a CIDH concluiu que ele estabelecia metas discriminatórias voltadas exclusivamente às mulheres, o que reforçava estereótipos de gênero e afetava os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres.
Quanto ao consentimento informado, a CIDH determinou que, ainda que Ramos Durand tivesse assinado algum documento prévio, não foram cumpridos os requisitos e condições necessárias para que o seu consentimento fosse livre e informado. A equipe de saúde a visitou em numerosas ocasiões, persuadindo-a, ainda que ela não desejasse a intervenção cirúrgica. Além disso, não lhe foi adequadamente informado sobre outros métodos anticonceptivos e a autorização foi obtida em menos de 48 horas antes da operação.
Quanto às condições adequadas para realizar o procedimento médico, a CIDH determinou que o centro de assistência médica no qual foi realizada a esterilização não contava com os recursos necessários, o que resultou na falta de assistência adequada durante a emergência médica que surgiu durante a intervenção.
A CIDH também enfatizou que o objetivo da cirurgia era a perda permanente da capacidade reprodutiva de Ramos Durand, o que violou seu direito de decidir livremente sobre o seu corpo e constituiu uma interferência arbitrária em sua vida privada. Ademais, considerou-se que Ramos Durand foi vítima de discriminação interseccional devido ao seu gênero e à sua situação econômica, e que a esterilização involuntária constituiu um ato de violência contra a mulher.
Quanto às garantias judiciais e à proteção judicial, a CIDH observou que as investigações sobre a esterilização e morte de Ramos Durand foram arquivadas em várias ocasiões, o que evidenciou a falta de diligência por parte do Estado. Além disso, afirmou-se que, depois de 24 anos da ocorrência dos fatos, não foi realizada uma investigação adequada em um prazo razoável, o que afeta o acesso à justiça das vítimas, em especial das suas filhas, que sofreram graves danos emocionais pela perda da mãe quando eram pequenas.
Em suma, a Comissão concluiu que o Estado é responsável pela violação dos direitos estabelecidos nos artigos 4.1 (direito à vida), 5 (integridade pessoal), 8 (garantias judiciais), 11 (vida privada e familiar), 13 (acesso à informação), 24 (igualdade perante à lei), 25 (proteção judicial) e 26 (direitos à saúde sexual e reprodutiva) da Convenção Americana, combinados com seu artigo 1.1 e 2 do mesmo instrumento, assim como o artigo 7 da Convenção de Belém do Pará, em detrimento da senhora Celia Edith Ramos Durand. Ademais, concluiu que o Estado violou o artigo 5.1 (integridade pessoal) em prejuízo dos seus familiares.
A CIDH recomendou ao Estado as seguintes medidas de reparação:
A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato deriva da Carta da OEA e da Convenção Americana de Direitos Humanos. A Comissão Interamericana está mandatada para promover a observância dos direitos humanos na região e atuar como órgão consultivo da OEA sobre o assunto. A CIDH é composta por sete membros independentes, eleitos pela Assembleia Geral da OEA em caráter pessoal, e não representam seus países de origem ou residência.
No. 186/23
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