Imprensa da CIDH
Washington, D.C. – No Dia da Terra, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e sua Relatoria Especial sobre Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (REDESCA) celebram a entrada em vigor do Acordo Regional sobre o acesso à informação, à participação pública e ao acesso à justiça em matéria ambiental, conhecido também como Acordo de Escazú. Também felicitam os Estados latino-americanos e caribenhos que somaram as 11 ratificações necessárias para sua entrada em vigor, expressando seu reconhecimento à Comissão Econômica para América Latina e o Caribe (CEPAL) que, em sua qualidade de impulsionadora e secretária do instrumento, vem articulando esforços com a sociedade civil e demais atores da região (incluindo a REDESCA), para a sua pronta adoção e ratificação.
Em harmonia com o expressado em seu recente comunicado conjunto com as presenças do Escritório da Alta Comissária de Direitos Humanos das Nações Unidas, a CIDH e a REDESCA consideram que o Acordo de Escazú reforça princípios e obrigações estabelecidos na normativa e na jurisprudência interamericana em matéria do direito a um meio ambiente sadio, realçando a necessidade de garantir os chamados "direitos de acesso" para assegurar sua vigência, como a proteção efetiva do direito das pessoas a defender o meio ambiente. Nesse sentido, fazem um chamado para que os Estados da América Latina e do Caribe que ainda não o tenham feito, ratifiquem ou adiram a este importante tratado, que tanto contribui para consolidar o reconhecimento e a efetiva proteção dos direitos ambientais na região.
A CIDH e sua Relatoria Especial também recordam que, sobre a base dos instrumentos interamericanos de direitos humanos, inter alia, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e o Protocolo de San Salvador, como a jurisprudência interamericana, o direito a um ambiente sadio é parte do catálogo de direitos que os Estados devem respeitar e garantir, tanto com caráter autônomo, como em sua indivisibilidade e interdependência com os demais direitos humanos. Por sua parte, a REDESCA chama especialmente os Estados a proteger os direitos da natureza nos casos em que sua constituição, legislação interna ou jurisprudência de tribunais nacionais assim o tenham previsto, destacando a importância que tais normativas e jurisprudência também possuem para a efetiva proteção do direito a um meio ambiente sadio e dos direitos humanos.
Para a CIDH e a REDESCA, o Acordo de Escazú é também um claro avanço normativo frente à degradação ambiental e à mudança climática, em um contexto cada vez mais preocupante para o planeta, e para os que defendem o ambiente. Segundo o Painel Intergovernamental de Mudança Climática (IPCC por suas siglas em inglês), os compromissos refletidos pelos Estados em suas obrigações derivadas do Acordo de Paris estariam longe de limitar a temperatura média global a 1.5°C; pelo contrário, se prevê uma trajetória rumo a uma temperatura acima de 2°C, se estes compromissos não forem implementados. Isto traria consequências devastadoras, sobretudo para milhões de pessoas que vivem em situação de pobreza, e que inclusive, no melhor dos casos, enfrentariam insegurança alimentar, migração forçada, enfermidades e mortes. Concretamente, os impactos climáticos abruptos como os de evolução lenta produzem mudanças nos ciclos naturais dos ecossistemas, secas, inundações, ondas de calor, incêndios, perdas das linhas costeiras, entre outros. Os mesmos que trouxeram consigo uma importante ameaça ao gozo de uma ampla gama de direitos, inter alia, o direito à vida, à alimentação, à moradia, à saúde, à água e o direito a um ambiente sadio.
A degradação da natureza, em geral, impacta de maneira desproporcional não apenas os seus ciclos vitais, mas também a subsistência das pessoas e os fatores necessários à obtenção de uma vida digna. No atual contexto da pandemia, a CIDH e a REDESCA recordam que a natureza oferece os elementos básicos para a saúde humana em todas as suas dimensões e contribui para os aspectos imateriais da qualidade de vida das pessoas, sendo o risco de dano especialmente alto para aqueles segmentos da população que atualmente se encontram em uma situação de marginalização ou vulnerabilidade, ou que, devido à discriminação e às desigualdades preexistentes, têm o acesso limitado aos recursos e à tomada de decisões, incluindo mulheres, crianças e adolescentes, povos indígenas, pessoas afrodescendentes, pessoas com deficiência, pessoas com que vivem na pobreza, assentamentos informais ou em situação de rua, migrantes e pessoas em mobilidade, populações campesinas e pessoas que vivem em zonas rurais, entre outros. Isto apesar do fato de que estas populações contribuem muito pouco para as emissões de gases de efeito estufa, a principal causa da crise climática.
Os impactos climáticos desproporcionais já são uma realidade nas Américas, como exemplifica a magnitude dos incêndios florestais na Amazônia e em outras zonas da região. A destruição de bosques não apenas contribui para a crise climática, mas também provoca o deslocamento forçado das comunidades, a perda de terras de subsistência e o grave risco para a subsistência dos povos indígenas em isolamento voluntário. Além disso, o aumento da temperatura global se associa a uma diminuição no volume dos rios e a uma tendência à seca dos rios na América Central; enquanto uma área entre 20% e 50% das geleiras andinas derreteu desde os anos 70. Tudo isso reduz a disponibilidade do recurso hídrico, colocando em risco a segurança alimentar de populações inteiras, especialmente daquelas que já se encontravam expostas a condições de precariedade e desigualdade social.
Na América Central, o direito à vida, a um meio ambiente sadio e à moradia, entre outros DESCA, estão sendo severamente afetados pela intensidade e frequência de fenômenos meteorológicos extremos, como furacões e inundações. Do mesmo modo, os fenômenos extremos intensificam a tendência histórica de migração, exemplificada pelo deslocamento da população causado pela seca e pela mudança no regime de chuvas nas regiões do "corredor seco", sobretudo nos três países do norte da América Central. No Caribe, a elevação do nível do mar, entre outros fenômenos extremos, acentua a perda e a erosão das áreas costeiras, a deterioração dos ecossistemas marinhos, a modificação dos habitats marinhos e a perda de manguezais e corais. Em especial, estima-se que todo o ecossistema de corais entraria em colapso até 2050. Resulta inegável que a perda da biodiversidade originada por estes impactos climáticos tem um impacto negativo sobre uma ampla gama de direitos humanos.
Frente a esta realidade, a CIDH e a REDESCA chamam os Estados a fortalecer de modo urgente suas políticas públicas ambientais frente à emergência climática, reiterando seu compromisso e disposição em contribuir com tudo o que esteja ao seu alcance para tais esforços. Nesse sentido, como mandato especializado da CIDH em direitos ambientais, a REDESCA seguirá estimulando ações para determinar a vinculação "entre os efeitos adversos da mudança climática e o pleno gozo dos direitos humanos", tal como previsto na Resolução da Assembleia Geral da OEA 2429 de 2008 sobre Direitos Humanos e Mudança Climática nas Américas. Nesse sentido, a CIDH incumbiu a REDESCA, no vigente Plano Estratégico 2017-2021, do desenvolvimento de parâmetros sobre meio ambiente e mudança climática, tarefa na qual o mandato vem avançando e se reflete, por exemplo, no Relatório sobre Empresas e Direitos Humanos: Parâmetros Interamericanos. Trata-se também de uma linha estratégica priorizada no Plano Trianual 2020-2023 da REDESCA, recentemente aprovado pela CIDH, para cuja implementação a CIDH e a Relatoria Especial chamam os Estados, a sociedade civil e demais atores relevantes nas Américas para ampla colaboração.
"Da CIDH, felicitamos a entrada em vigor do Acordo de Escazú e o muito que ele significa para uma melhor proteção dos direitos ambientais na América Latina e no Caribe, destacando seu caráter complementar aos instrumentos e obrigações do sistema interamericano na matéria". "No Dia da Terra, destaco a urgência em se atender as implicações dos impactos ao meio ambiente para a sobrevivência física e cultural dos povos indígenas, assim como para o seu direito a viver em harmonia com a natureza e para o seu direito a um ambiente sadio, seguro e sustentável. A pandemia faz ainda mais urgente que se preste atenção na realidade desses povos, e que se aprenda com a sua sabedoria ancestral de respeito e cuidado pela natureza", destacou a Presidenta da CIDH e Relatora para os povos indígenas, Antonia Urrejola.
Nas palavras da Relatora Especial sobre DESCA, Soledade García Muñoz: "No dia da Terra, celebrar a entrada em vigor do Acordo de Escazú também clama pela lembrança de que a mudança climática é uma das maiores ameaças para o pleno gozo e exercício dos direitos humanos pelas gerações presentes e futuras, para a saúde dos ecossistemas, bem como de todas as espécies que habitam as Américas". "Estamos frente a uma emergência que, somada à pandemia, exige determinação e compromisso dos Estados americanos para proteger tanto os direitos humanos como a natureza. No atual contexto, as respostas efetivas à crise ambiental vão junto com as requeridas pela crise sanitária, econômica e social que atravessamos", acrescentou.
A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.
No. 098/21