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Comunicado de Imprensa

A CIDH apresenta caso sobre a Guatemala perante a Corte Interamericana

8 de dezembro de 2020

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Washington, D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) apresentou em 25 de novembro de 2020 perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte-IDH) o caso Steven Edward Hendrix, relacionado à Guatemala, que se refere à violação de vários direitos consagrados na Convenção Americana em decorrência de decisões administrativas e de uma decisão judicial que impediram a Steve Edward Hendrix o exercício da profissão de notário, apesar de contar com o respectivo título universitário obtido na Guatemala, em razão de não ser de nacionalidade guatemalteca.

Em seu Relatório de Mérito, após determinar que foi imposta a Hendrix uma restrição e diferença de tratamento estabelecida no Código Notarial, a Comissão procedeu à análise sobre se esta restrição resulta compatível com a Convenção Americana, considerando o escrutínio rigoroso exigido pela referida restrição e diferença de tratamento baseada em uma das categorias estabelecidas no artigo 1.1, como a origem nacional, recorrendo para tanto a um juízo escalonado de proporcionalidade.

Considerando que as decisões que impediram a vítima de exercer o notariado na Guatemala foram baseadas no artigo 2.1 do Código Notarial, a CIDH considerou que o requisito de legalidade da restrição se encontra satisfeito. Quanto à finalidade da restrição, também avaliou que tal requisito se encontra satisfeito, dado que a invocação por parte do Estado de um argumento de “soberania” como mecanismo para garantir o uso adequado da fé pública constitui um fim legítimo.

Com relação à idoneidade da restrição, a Comissão analisou se existe ou não uma relação de meio e fim entre a distinção e o fim que se persegue, isto é, se proibir que pessoas estrangeiras exerçam a função notarial na Guatemala contribui de algum modo com o fim invocado pelo Estado. Em primeiro lugar, a Comissão determinou que o Estado não justificou ou explicou detalhadamente as razões pelas quais conferir fé pública a uma pessoa estrangeira poderia colocar em risco a soberania nacional. Em segundo lugar, quanto ao argumento do Estado segundo o qual o notário é um funcionário público e, portanto, deveria ser nacional, a CIDH observou de maneira preliminar que, tanto na legislação nacional como na legislação comparada disponível, a figura do notário não tem sido identificada com a de um servidor ou funcionário público, dado que não representa a vontade do Estado.

Apesar de o Estado não ter apresentado qualquer explicação, a CIDH entendeu que na argumentação estatal sobre o fim legítimo podem estar subjacentes aspectos como o melhor conhecimento que uma pessoa nacional poderia ter a respeito da legislação e a confiabilidade que poderia ter na cidadania para exercer a referida função, em se tratando de um aspecto tão relevante como é a fé pública. No entanto, a Comissão considerou que ainda que se supusesse que tal argumentação fosse válida, o Estado conta com meios menos lesivos para poder satisfazer o mesmo fim, em vez da proibição absoluta às pessoas estrangeiras do exercício da função notarial. Em acréscimo, ponderou que a qualidade técnica de pessoas estrangeiras em igualdade de condições com nacionais pode ser alcançada por meio da revalidação dos estudos ou aplicação de um teste de conhecimentos; e, além disso, que um regime de prestação de contas ou avaliações periódicas dos que exercem a função de notariado permitiria fiscalizar a observância e confiabilidade no seu correto proceder.

Em terceiro lugar, a Comissão assinalou que diferentes tribunais nacionais e internacionais que analisaram proibições a não nacionais para exercer o notariado em sistemas notariais latinos consideraram que tais limitações constituem discriminação por nacionalidade ou restrições ao direito ao trabalho que não são razoáveis. De acordo com a jurisprudência comparada e internacional resenhada pela CIDH, se observa, com respeito à função notarial, que: i) não se equipara à qualidade de servidor ou funcionário público no sentido tradicional; ii) não exerce funções que alcancem o “coração do governo representativo”; iii) não tem nenhum papel na formulação ou na execução de políticas públicas; e iv) não conta com faculdades coercitivas ou sancionadoras. Além disso, as funções das pessoas notárias são suscetíveis de serem objeto de prestação de contas em caso de atuações irregulares, sem prejuízo de que possam ser também sujeitas a verificações ou avaliações de conhecimentos de forma periódica a fim de assegurar sua qualidade técnica e adequada condução.

Em face do acima descrito, a CIDH concluiu que o Estado não forneceu razões suficientes que permitam acreditar que proibir o exercício do notariado na Guatemala a pessoas estrangeiras constitui uma restrição que satisfaça as exigências estabelecidas pela Convenção Americana. Em virtude disso, a Comissão concluiu que a disposição contemplada no artigo 2.1 do Código Notarial da Guatemala e a consequente restrição e diferença de tratamento à vítima que teve impedida sua inscrição como notário na Guatemala, requisito indispensável para exercer tal profissão, resultam arbitrárias, e, portanto, violadoras do princípio da igualdade e não discriminação estabelecido no artigo 24 da Convenção Americana, combinado com as obrigações estabelecidas em seus artigos 1.1 e 2.

Em seu Relatório de Mérito a Comissão recomendou ao Estado:

1. Reparar integralmente as violações de direitos declaradas no Relatório de Mérito, incluindo o pagamento de uma indenização pelos danos ocasionados. Em particular, adotar o pagamento de uma indenização pela imposição de uma restrição e diferença de tratamento arbitrária.
2. Adotar as medidas necessárias para permitir a inscrição de Steven Edward Hendrix como notário perante o Colégio de Advogados e Notários e o exercício da profissão de notário na Guatemala.
3. Tomar as medidas legislativas e de outra índole, necessárias para deixar sem efeito o requisito de ser guatemalteco natural para exercer o notariado, estabelecido no artigo 2.1 do Código Notarial da Guatemala.

A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.

No. 292/20