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Comunicado de Imprensa

Em face da pandemia do COVID-19, a CIDH manifesta sua preocupação pela situação especial de risco que as pessoas privadas de liberdade enfrentam na região

9 de setembro de 2020

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Washington, D.C. – Por meio de diferentes mecanismos – incluindo sua Resolução No. 01/20 sobre Pandemia e Direitos Humanos nas Américas – a CIDH se pronunciou sobre a especial situação de vulnerabilidade enfrentada pelas pessoas privadas de liberdade na região, que se tornou mais aguda durante a pandemia gerada pelo vírus do COVID-19. Nesse sentido, insta os Estados a adotar medidas urgentes que permitam responder de maneira oportuna às problemáticas dos sistemas penitenciários que estariam sendo exacerbadas nesse contexto. Em especial, a CIDH reitera o chamado para reduzir a população carcerária, através da aplicação de medidas alternativas à privação de liberdade.

A Comissão observa que a situação de especial vulnerabilidade que se abate sobre as pessoas privadas de liberdade se deve não somente às deficiências estruturais que caracterizam os respectivos sistemas penitenciários da região – originadas em grande medida pelos altos níveis de superlotação – mas também à falta de implementação de medidas de prevenção e de resposta oportunas para evitar a propagação do vírus. Nesse sentido, em conformidade com as informações ao seu alcance, a CIDH alerta que os sistemas carcerários na região se caracterizam, entre outras questões, por: i) a impossibilidade de contar com a habilitação de espaços com distância adequada, prover atenção médica adequada e evitar o contágio, tendo em vista os altos níveis de superlotação; ii) o escasso número de testes de detecção, e iii) a falta de produtos de higiene e proteção necessários.

Com relação aos altos níveis de superlotação que caracterizaram a região, a CIDH observa que, em termos gerais, dados de World Prison Brief dão conta de que atualmente há um total de 3.872.463 pessoas nas prisões. Com base na capacidade de acomodação das prisões, a média regional de superlotação é de 144,2%. Em determinados países, e em atenção aos elevados níveis de superlotação, a situação é especialmente preocupante. Nesse sentido, o Haiti tem a taxa de superlotação mais alta da região, com um nível de 454,4%, seguido pela Bolívia e pelo Peru, nos quais os níveis de superlotação alcançam, respectivamente, 363,9% e 240,3%. O Brasil, por sua vez, constitui o terceiro país com maior população carcerária do mundo. Segundo dados oficiais do DEPEN, no final de dezembro de 2019, a quantidade de pessoas privadas de liberdade no país equivaleria a 755.274, com uma taxa de superlotação de 170,74%. Em Honduras, segundo as últimas cifras publicadas pelo Instituto Nacional Penitenciário (INP) em finais de junho, haveria uma população carcerária de 21.872, o que, de acordo com a informação aportada pelo Estado, representa uma taxa de superlotação de 148%.

Através de todos os seus mecanismos, a CIDH manifestou sua preocupação pelos altos níveis de superlotação dos cárceres na região. Nesse sentido, assinalou que a superlotação constitui um dos principais problemas em matéria de privação de liberdade nas Américas, e entre outras questões, representa sérios riscos para a vida e a integridade pessoal das pessoas detidas. Em especial, a Comissão se referiu às graves consequências da superlotação para a saúde das pessoas privadas de liberdade em face do avanço do COVID-19. Nesse sentido, a CIDH assinala que a superlotação constitui uma ameaça em razão do aumento do risco de contágio de enfermidades infecciosas, tal e como foi indicado em seu comunicado de 31 de marzo. Segundo as informações disponíveis, esta situação afeta em maior medida as pessoas que estão em grupos em situação de risco, como idosos, e pessoas com enfermidades crônicas ou autoimunes. Ainda em atenção aos altos níveis de superlotação, a CIDH considera que os espaços nos cárceres que são caracterizados por altos níveis de superlotação não permitem que se possa contar com uma distância adequada para evitar o contágio do COVID-19.

Nesse contexto, e frente à pandemia do COVID-19, a CIDH observa que diversos países da região adotaram diversas medidas para prevenir a propagação do vírus, principalmente através da redução da população carcerária. Nesse sentido, foram implementadas principalmente dois tipos de iniciativas: as que buscam aplicar medidas alternativas à privação de liberdade e aquelas que se dirigem a comutar a pena mediante indultos e anistias. Em termos gerais, essas iniciativas estariam dirigidas a pessoas que cometeram delitos não violentos, e que pertenceriam a grupos que se encontram em situação especial de risco, tais como idosos, pessoas que padecem de enfermidades crônicas ou autoimunes, mulheres grávidas, e mães com filhos e filhas pequenas. Entre as medidas que buscam a aplicação de medidas alternativas, a CIDH destaca: i) o Decreto No. 36-2020 de Honduras, emitido em 10 de junho de 2020, que, ademais, abre a possibilidade de que sejam impostas medidas alternativas à prisão preventiva relativamente aos delitos considerados como indesculpáveis pelo artigo 184 do Código de Processo Penal; ii) os Decretos Legislativos do Peru No. 1459 e No. 1513, emitidos em 14 de abril e 4 de junho de 2020, respectivamente iii) o Decreto Legislativo N° 546-2020 de Colômbia, publicado em 14 de abril de 2020, e vi) a Recomendação No. 062/2020 do Conselho Nacional de Justiça do Brasil de 17 de marzo de 2020. Por sua vez, a CIDH ressalta que a  Lei de Anistia do México de 20 de abril e o Decreto Supremo No. 004-2020-JUS do Peru de 22 de abril buscam a concessão de graça para o desencarceramento de pessoas detidas. De igual forma, o Decreto Supremo OO6-2020-JUS do Peru, emitido em 1 de maio de 2020, estabelece critérios para conceder indulto a adolescentes em conflito com a lei.

Apesar das iniciativas adotadas, a situação das pessoas privadas de liberdade na região no contexto da pandemia ainda é uma das preocupações centrais da CIDH na matéria, sobretudo ao serem tais pessoas colocadas em risco especial de contágio e de não contarem com atenção médica adequada para o tratamento do COVID-19. Nesse sentido, em conformidade com dados disponíveis, estima-se que em meados de agosto haveria um total de 138.522 casos positivos nas prisões da região, e ao menos 1.504 pessoas falecidas intramuros em decorrência do vírus do COVID-19. Nesse sentido, a CIDH adverte que essas cifras podem ser significativamente mais altas devido à falta de coleta e publicação precisa sobre a quantidade de casos de COVID-19 nos respectivos sistemas penitenciários.

A CIDH também observa que outro fator explicaria a possibilidade de um sub registro de contágios e falecimentos por COVID-19, qual seja a escassa quantidade de testes de detecção realizados. No Brasil, por exemplo - segundo os dados do DEPEN – em 3 de setembro havia apenas 64.536 pessoas privadas de liberdade que teriam realizado o teste, o que corresponde a menos de 8,34%% do total da população penitenciária. Em Honduras, o Estado informou que se havia realizado um total de 4.593 teste de diagnóstico dentro do sistema penitenciário do país, o que equivaleria apenas a 20,9% da população penitenciária. No entanto, a CIDH adverte que este número seria ainda menor, levando-se em conta que a quantidade de testes relatados também incluiria o pessoal penitenciário. Do mesmo modo, na Venezuela, segundo informação reportada por familiares ao Observatório  Venezuelano de Prisões, os testes de detecção do vírus estariam sendo feitos principalmente com funcionários nos centros de detenção e não com as pessoas detidas. 

Por outro lado, a Comissão observa que em face da pandemia de COVID-19, uma das medidas mais comuns implementadas pelos Estados da região para evitar o contágio do vírus foi a suspensão de visitas aos centros penitenciários, o que bloqueia a obtenção de insumos de higiene e proteção sanitária. Nesse contexto, em países como Colômbia, Honduras, México e Venezuela – segundo informações apresentadas à CIDH por organizações civis – o acesso regular aos produtos de asseio pessoal que eram oferecidos pelos familiares às pessoas detidas estaria seriamente restringido. No caso do Brasil, segundo os resultados do questionário realizado por Pastoral Carcerária, respondido por diferentes atores vinculados ao sistema penitenciário, em torno de 65,9% dos respondentes indicaram que os produtos de higiene e alimentos enviados às pessoas privadas de liberdade não estariam entrando nas prisões. Nesse sentido, e retomando o chamado realizado pelo Subcomitê das Nações Unidas para a Prevenção da Tortura, a Comissão reitera que os Estados devem permitir que os familiares continuem a enviar produtos necessários para a higiene e alimentação das pessoas detidas, adotando-se as medidas de proteção necessárias para evitar a propagação do vírus.

Da mesma forma, a restrição de visitas também poderia ter sérias consequências para a saúde mental das pessoas privadas de liberdade. Nesse sentido, segundo informações enviadas à CIDH, a proibição de visitas na Colômbia também se aplicaria ao pessoal da psicologia e do serviço social, o que estaria impactando o bem-estar geral das pessoas detidas. Nesse contexto, a CIDH insta os Estados – no mesmo sentido do chamado feito pela Escritório da Alta Comissária da Nações Unidas para os Direitos Humanos e a Organização Mundial da Saúde – que, em face da restrição de visitas físicas, adotem outras medidas como videoconferências, aumento de telefonemas e comunicação eletrônica.

Diante do exposto, e em face da pandemia do COVID-19, a Comissão reitera a obrigação especial que os Estados da região têm de adotar as medidas urgentes e imediatas voltadas à proteção da vida, saúde e integridade das pessoas sob sua custódia. Em especial, a CIDH insta os Estados a realizar ações voltadas à redução da população carcerária. Tudo isso, levando em conta diversas recomendações da Comissão na matéria, contidas principalmente na Resolução No. 01/20 sobre Pandemia e Direitos Humanos nas Américas, e nos comunicados de imprensa de 31 de março e de 26 de junho. A implementação dessas medidas é de especial urgência considerando que as consequências da pandemia representam um risco maior para a população que se encontra privada de liberdade.

A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.

No. 212/20