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Comunicado de Imprensa

A CIDH expressa profunda preocupação pela situação de pessoas migrantes e refugiadas nos Estados Unidos, México e América Central

23 de julho de 2019

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Washington, D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) expressa sua preocupação pela situação de pessoas migrantes e refugiadas nos Estados Unidos da América, México e América Central, em especial pelas recentes políticas e medidas adotadas pelos Estados em matéria de migração e asilo; a securitização, militarização e externalização das fronteiras; assim como a criminalização de defensores de direitos humanos de pessoas migrantes e refugiadas. A Comissão insta os Estados da região a respeitarem e garantirem os direitos das pessoas migrantes e refugiadas, assim como os dos defensores de seus direitos humanos.

Durante os últimos anos, a CIDH vem observando o aumento da migração de pessoas provenientes de El Salvador, Guatemala, Honduras e Nicarágua, que buscam chegar aos Estados Unidos e, em menor medida, ao México. Um dos fatores que incidiu neste aumento são as denominadas "caravanas de migrantes", que incluem pessoas com necessidades de proteção, como solicitantes de asilo, refugiados, famílias, mães, mulheres, crianças e adolescentes, em particular aquelas pessoas que viajam sozinhas, entre outras. Sobre a magnitude do fenômeno, o Relatório Tendências Globais: Deslocamento Forçado em 2018 da Agência da Organização das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) evidencia que em finais de 2018 foram registrados 314.946 solicitantes de asilo e 72.229 refugiados desses países em nível mundial e reconhece as complexidades e desafios que são colocados com a chegada massiva de pessoas no contexto de movimentos migratórios mistos.

A CIDH observa que como resposta a esta situação, os Estados Unidos da América e os Estados Unidos Mexicanos têm implementado políticas e práticas de maneira conjunta em matéria de migração e asilo, que estão tendo impacto direto nos direitos humanos de migrantes, solicitantes de asilo e refugiados. A partir da implementação unilateral do programa "Fique no México", os Estados Unidos devolveram ao México mais de 10.000 pessoas para que aguardem ali enquanto são realizados seus procedimentos migratórios e de asilo. Além disso, ambos os países têm colaborado na coordenação de agendamentos para iniciar os processos de asilo, por meio da qual cerca de 18.778 pessoas teriam esperado em um porto de entrada fronteiriço no México até o início de junho para apresentar sua solicitação de asilo perante os Estados Unidos.

A Comissão observa que essas políticas são contrárias às obrigações em matéria de direitos humanos, em particular no que toca ao direito de solicitar e receber asilo, o princípio de não devolução (non-refoulement), dado que, entre outros, expõem essas pessoas a numerosos riscos, que incluem a extorsão, o sequestro e outros atos de violência em mãos de organizações criminosas e delinquentes comuns que se encontram nas zonas nas quais estão sendo devolvidas essas pessoas, assim como a falta de acesso a serviços de assistência básica. A CIDH insta os Estados da região a tomarem medidas urgentes e integrais para garantirem vias seguras para que as pessoas busquem proteção internacional. Ademais, a CIDH recebeu informação sobre as dificuldades para as pessoas migrantes e solicitantes de asilo no marco desse programa para garantirem seu direito ao devido processo e à proteção judicial, dado que devem esperar vários meses no México até suas audiências nos Estados Unidos, assim como sobre as dificuldades para terem acesso aos tribunais e terem representação legal. De acordo com informação oficial, de janeiro a julho deste ano, o México recebeu em seu território mais de 30 mil solicitações de refúgio.

A CIDH também recebeu informação sobre casos de separação de famílias sob o Programa "Fique no México" nos quais os pais e/ou mães permanecem no México, enquanto seus filhos são enviados ao Escritório de Reassentamento de Refugiados (ORR) dos Estados Unidos da América. A CIDH reitera que o direito à não devolução estabelece a proibição de expulsar ou devolver as pessoas para onde seus direitos à vida, à integridade pessoal e a outros direitos humanos estejam em risco de serem violados. A CIDH reitera que a separação das crianças sem a presença dos seus pais ou tutores é contrária às normas e parâmetros de direito internacional e ao sistema interamericano de direitos humanos e insta os Estados Unidos a cessar de imediato toda prática dirigida a separar crianças dos seus pais ou tutores como uma medida para impedir a migração.

A CIDH também tomou nota do anúncio feito pelos Estados Unidos no final de maio de que imporiam tarifas aos produtos mexicanos se o México não freasse a migração aos Estados Unidos. Como resultado do anúncio feito pelo governo dos Estados Unidos, em 07 de junho de 2019, ambos os Estados firmaram um acordo. Ao mesmo tempo, a CIDH observa que, após o referido anúncio, o Estado mexicano informou que havia deportado 39.653 migrantes nos primeiros quatro meses de 2019 e havia enviado 6.000 agentes da Guarda Nacional à fronteira com a Guatemala a fim de reforçar sua fronteira sul. A CIDH expressa sua preocupação em face dos impactos que a possibilidade de impor qualquer tipo de represália comercial entre dois países pode ter nos direitos humanos de pessoas migrantes, solicitantes de asilo e refugiados, incrementando, em consequência, sua situação de vulnerabilidade.

Além disso, em 31 de maio, foi anunciado que o governo estadunidense enviará dezenas de agentes do Departamento de Segurança Nacional à fronteira norte da Guatemala com o México para ajudar as autoridades guatemaltecas a frear em sua origem o êxodo migratório centro-americano para os Estados Unidos. Mais recentemente, em meados de junho de 2019, o governo dos Estados Unidos cortou os fundos de assistência financeira aos países do Triângulo do Norte da América Central. Em conformidade com normas internacionais e interamericanas do Direito Internacional dos Direitos Humanos, todas as pessoas têm direito a saírem livremente de qualquer país, inclusive do próprio; assim como direito a solicitarem e receberem asilo e à proteção do seu direito e princípio de não devolução. A Comissão vê com extrema preocupação a militarização das fronteiras e chama os Estados para que as medidas que implementem, incluídas as relacionadas aos aspectos econômicos, estejam orientadas pelo respeito e garantia dos direitos humanos das pessoas migrantes e refugiadas.

Recentemente, a CIDH também recebeu informação relativa às negociações em curso entre os Estados Unidos e a Guatemala para estabelecerem um acordo de terceiro país seguro. Se o acordo for firmado, as pessoas que têm atravessado pela Guatemala não poderão solicitar asilo nos Estados Unidos e as solicitantes de asilo que cheguem à fronteira dos Estados unidos serão devolvidas à Guatemala ou aos seus países de origem. Os fatos de violência e as violações de direitos humanos que a CIDH tem monitorado através das suas visitas, relatórios de países e outros mecanismos de monitoramento relativos à Guatemala e ao México nos últimos anos põem em evidência que esses países não teriam condições para oferecerem as garantias de segurança que um terceiro país seguro deve garantir. Este acordo poderia aumentar as condições de vulnerabilidade para as pessoas migrantes e refugiadas e poderia expô-las a riscos maiores que os que as levaram a se deslocarem originariamente. A Comissão Interamericana também observa que em 14 de julho, a Corte de Constitucionalidade da Guatemala proveu um recurso provisório destinado a impedir que o Presidente firmasse um acordo de terceiro país seguro com os Estados Unidos da América.

Em acréscimo ao acima assinalado, a CIDH expressa sua profunda preocupação com uma regulação interina anunciada pelos Estados Unidos em 15 de julho que impedirá que muitos migrantes solicitem asilo no país. Esta regulação estabelece que "com limitadas exceções, um estrangeiro que ingresse ou tente ingressar nos Estados Unidos através da fronteira sul após não solicitar a proteção em um terceiro país fora do país de cidadania, nacionalidade ou última residência legal habitual através do qual o estrangeiro esteve em trânsito até os Estados Unidos não é elegível para o asilo". Considerando a gravidade e a multiplicidade de fatores que obrigam os migrantes da América Central a fugirem dos seus países, que vão desde graves atos de violência a privações econômicas e ambientais extremas, a CIDH considera que esta regulação é contrária ao direito humano a buscar e receber e asilo, a proteção contra a devolução e contraria as normas e parâmetros internacionais e interamericanos. A CIDH reitera que qualquer ato unilateral, bilateral ou multilateral adotado por um Estado em relação com a migração ou o asilo deve estar em conformidade com suas obrigações internacionais e interamericanas. Qualquer ato que viole estas obrigações implicará a responsabilidade internacional desse Estado.

A CIDH também expressa sua preocupação pela morte de cinco crianças migrantes da Guatemala e uma de El Salvador sob custódia dos Estados Unidos desde setembro. A CIDH expressou sua preocupação pelas mortes de Jakelin Caal Maquín e Felipe Gómez Alonzo, às quais se somou as de Juan de León Gutiérrez, Carlos Gregorio Hernández Vásquez e uma menina de 10 anos de El Salvador, que morreram sob custódia das autoridades estadounidenses. A estes graves fatos também se soma a trágica morte, ocorrida no último 24 de junho, de Óscar Alberto Martinez Ramírez e sua filha Valeria, de 23 meses de idade, procedentes de El Salvador, que se afogaram quando tentavam atravessar o Rio Bravo para chegar aos Estados Unidos da América. A CIDH insta os Estados Unidos a investigar as circunstâncias que levaram a essas mortes e a tomar todas as medidas necessárias para o respeito e a garantia dos direitos à vida, à integridade pessoal e à saúde das pessoas migrantes e refugiadas.

Ao mesmo tempo, a CIDH reitera que os Estados não podem recorrer à privação de liberdade de crianças ou adolescentes que se encontram junto aos seus pais, assim como daqueles que se encontram desacompanhados ou separados dos seus pais, para assegurar os objetivos de um processo migratório, nem tampouco podem fundamentar a privação da liberdade de crianças no descumprimento dos requisitos para ingressar e permanecer em um país, no fato de que se encontrem sozinhas ou separadas de suas famílias, ou na finalidade de assegurar a unidade familiar. A detenção migratória de crianças nunca responde ao interesse superior delas e portanto os Estados devem adotar medidas para garantir sua liberdade pessoal.

"As mortes de crianças que buscavam proteção ou um futuro melhor são tragédias que nos recordam das horríveis consequências de tratar a migração com uma visão de segurança pública em vez de com um enfoque de direitos humanos. Os Estados devem por fim à detenção migratória de crianças e adolescentes", disse a Comissionada Esmeralda de Troitiño, Presidenta da CIDH e Relatora sobre os Direitos da Criança.

A Comissão recebeu informação adicional que indica a existência de superlotação e más condições de detenção nos centros de detenção migratórios e provisórios mexicanos, assim como detenções de crianças e adolescentes no México. De acordo com informação oficial. o Estado mexicano informou que devido à chegada de movimentos migratórios massivos, foi superada sua capacidade instalada e que foram destinados recursos humanos e financeiros adicionais para melhorar as condições dos referidos centros de detenção e dar atenção às pessoas migrantes, incluídos os grupos em situação de vulnerabilidade.

Por sua vez, em 2 de julho, o Escritório do Inspetor Geral do Departamento de Segurança Nacional dos Estados Unidos da América publicou um relatório sobre a superlotação, a má alimentação e as condições insalubres nos centros de detenção de migrantes. A CIDH insta os Estados a evitarem o uso da detenção migratória com fins punitivos e como uma medida automática e generalizada para responder a movimentos migratórios. A CIDH recorda que a detenção de pessoas migrantes deve ser uma medida de último recurso, à qual só se pode recorrer pelo menor tempo possível no cumprimento dos princípios de excepcionalidade, necessidade e proporcionalidade, com condições dignas de detenção, e a não deter, sob nenhuma hipótese, crianças, adolescentes e suas famílias.

A CIDH também expressa sua preocupação pelo aumento de medidas, tomadas pelos Estados Unidos e pelo México, tendentes à criminalização dos defensores de direitos humanos que oferecem assistência às pessoas migrantes e refugiadas. A CIDH observa que em 5 de junho de 2019 foram detidos e acusados de tráfico de migrantes os defensores de direitos humanos de pessoas migrantes Cristóbal Sánchez e Irineo Mujica. De acordo com a informação disponível, em 11 de junho estas pessoas foram postas em liberdade por ordem de um juiz de Chiapas por não haver provas suficientes para abrir um processo contra elas. A CIDH expressa sua preocupação pelos atos de assédio contra as pessoas que ajudam a pessoas migrantes e refugiadas e insta as autoridades nos países de trânsito e destino a tomarem medidas urgentes para proteger e legitimar o trabalho dos defensores de direitos humanos.

A propósito, nos Estados Unidos da América, Scott Warren, professor universitário membro da organização da sociedade civil "No More Deaths" enfrentou três acusações de delitos graves por oferecer água, comida, roupa limpa e uma cama para dormir a pessoas migrantes em Ajo, Arizona, fatos pelos quais poderia ser condenado até 20 anos de prisão em caso de ser declarado culpado. Em 11 de junho de 2019, um juiz declarou nulo o juízo já que o júri não logrou alcançar um veredito. Em 3 de julho, o governo anunciou que processaria novamente Warren em novembro. A Comissão chama os Estados Unidos a respeitarem e garantirem o direito a defender direitos humanos e, por tanto, a não criminalizar os defensores de direitos humanos pelo trabalho que realizam nem as pessoas que oferecem ajuda humanitária a migrantes e refugiados.

Por último, a CIDH toma nota que, em 20 de maio de 2019, o Estado mexicano apresentou o Plano de Desenvolvimento Integral Guatemala - Honduras - El Salvador - México, desenvolvido em colaboração com a CEPAL e 16 agências das Nações Unidas. A CIDH considera positivo que sejam implementadas medidas para abordar as causas estruturais que dão origem à migração forçada, tais como promover desenvolvimento e condições de vida dignas para todas as pessoas em suas comunidades de origem. Em atenção à complexa situação enfrentada pelos países de origem das pessoas migrantes, solicitantes de asilo e refugiados, as medidas acima referidas devem ser acompanhadas pela garantia dos direitos humanos destas pessoas, em particular o direito de todas as pessoas a saírem livremente de qualquer país, o direito a solicitar e receber asilo e o direito e princípio de não devolução, assim como criar canais regulares, seguros e acessíveis para a migração. Estes canais devem ser acessíveis em termos econômicos e jurídicos, o que inclui assegurar que também sejam acessíveis para pessoas em situação de pobreza, assim como para aquelas que, por razões alheias à sua vontade, não contem com a documentação usualmente requerida para esses trâmites.

Ao mesmo tempo, em informação oficial fornecida pelo governo estadunidense. destaca-se a importância que os Estados Unidos dão às ações que Estados da região vêm realizando de maneira conjunta na implementação do Marco Integral Regional para a Proteção e Soluções (MIRPS), destinado a desenvolver um marco integral de resposta para os refugiados (CRRF) e fomentar uma maior cooperação regional para responder aos desafios gerados pelo deslocamento forçado. A CIDH destaca a importância da cooperação e da responsabilidade compartilhada nas respostas que os Estados dão a assuntos transnacionais como é o da questão migratória e a necessidade de que tais respostas estejam baseadas na proteção dos direitos humanos das pessoas migrantes, solicitantes de asilo e refugiadas; a participação e liderança dos Estados, as organizações da sociedade civil, a academia, os meios de comunicação, o setor privado, as organizações internacionais e as pessoas mesmas a quem essas medidas serão dirigidas e, sobretudo, a vontade política para colocá-las em prática.

A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.

 

No. 180/19