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Comunicado de Imprensa

CIDH denuncia a deterioração do estado de direito diante das graves violações de direitos humanos e crimes contra a humanidade na Nicarágua

10 de janeiro de 2019

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Washington, D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) denuncia a deterioração do estado de direito diante da grave crise de direitos humanos iniciada na Nicarágua em 18 de abril. A CIDH urge que o Estado da Nicarágua restaure as condições para garantir as liberdades fundamentais e os direitos humanos do seu próprio povo para a vigência do estado democrático de direito.

A CIDH alerta que a grave crise de direitos humanos no país dura mais de oito meses devido à instalação de fato de um estado de exceção caracterizado pelo exercício abusivo da força pública para reprimir as vozes dissidentes ao Governo, as buscas e apreensões, fechamento e censura dos meios de comunicação, a prisão ou exílio de jornalistas e líderes sociais, assim como a ingerência e o controle do Poder Executivo nos demais poderes públicos. Estes fatores perpetuam a impunidade das violações de direitos humanos ocorridas no contexto da repressão estatal aos protestos que ocasionou a morte de 325 pessoas e mais de 2.000 feridas; 550 pessoas presas e denunciadas criminalmente; a demissão de 300 profissionais da saúde; e a expulsão de pelo menos 144 estudantes da Universidade Nacional Autônoma da Nicarágua (UNAN).

Conforme a Constituição nicaraguense, o poder soberano manifesta-se através do Poder Legislativo, Poder Executivo, Poder Judiciário e Poder Eleitoral. Estes possuem funções especializadas e separadas, devendo colaborar harmonicamente entre si para a realização de seus objetivos. Igualmente, a Nicarágua é reconhecida como um Estado Democrático e Social de Direito, que promove “a proeminência dos Direitos Humanos” e “adere aos princípios que conformam o Direito Internacional Americano reconhecido e ratificado soberanamente.” A CIDH observa que na Nicarágua o princípio da separação de poderes foi rompido mediante a repressão contra as vozes dissidentes ordenada desde o Executivo através das forças policiais regulares e irregulares, e pelas instituições de controle do Estado, como o Ministério Público e o Poder Judiciário. Esta ingerência e controle do Poder Executivo nos demais poderes públicos também é resultado de outros fatores, como a ingerência partidária em todas as instituições públicas através dos Conselhos de Liderança Sandinista (CLS), e o controle dos meios de comunicação, e o falso contrapeso exercido pela Assembleia Nacional.

Os protestos iniciados desde abril de 2018 foram reprimidos através do uso da força letal por grupos policiais e parapoliciais sob o comando da Presidência da República, cujo titular é o Chefe Supremo das mesmas. Além disso, foi criado um estado policial no país, que busca silenciar a dissidência e fechar os espaços democráticos no país através de medidas adotadas pela Polícia Nacional para rotular as manifestações públicas como ilegais, exigir arbitrariamente autorização prévia para a realização de protestos, invadir e ocupar instalações das organizações de direitos humanos e meios de comunicação independentes, assim como realizar centenas de detenções arbitrárias.

Adicionalmente, a Comissão adverte que as centenas de detenções arbitrárias; a criminalização seletiva e massiva de manifestantes, pessoas defensoras dos direitos humanos, jornalistas, estudantes, líderes sociais e opositores do Governo mediante acusações infundadas e desproporcionais; o padrão sistemático de violações às garantias do devido processo; a falta de efetividade do recurso de exibição pessoal; as irregularidades relativas à defesa jurídica e publicidade dos processos; assim como a abertura de processos relacionados com tipos penais como o terrorismo, interpretadas de forma incompatível com a vigência de uma sociedade democrática; o descumprimento de ordens de liberação em benefício daqueles que participaram dos protestos no país e; em geral, a manipulação do direito penal para a judicialização de qualquer oposição, evidenciam a falta de independência do sistema de administração da justiça nicaraguense em seu conjunto.

Da mesma forma, a informação ao alcance da Comissão indica que, há vários anos, a Assembleia Nacional nicaraguense funciona como um ramo do Poder Executivo. No contexto da crise, a Assembleia Nacional decretou a dissolução forçada de nove organizações defensoras de direitos humanos e opositoras do Governo, como represália ao seu trabalho de denunciar a grave situação do país, tema que já foi matéria de pronunciamento pela CIDH.

A CIDH recebeu informações consistentes sobre a falta de independência e neutralidade do Conselho Supremo Eleitoral nicaraguense em virtude de decisões adotadas com a finalidade de enfraquecer e marginalizar as forças da oposição em processos eleitorais. Isto teria facilitado o controle da Assembleia Nacional pelo partido governista e sua perpetuação no poder.

A CIDH insiste na importância da separação de Poderes mediante um sistema de freios e contrapesos com o objetivo de garantir um efetivo controle entre os diferentes ramos do poder. A independência judicial é uma característica fundamental da separação de poderes para garantir o estado democrático de direito.

Em 21 de dezembro, o Grupo Interdisciplinar de Especialistas Independentes (GIEI) instalado pela CIDH apresentou o seu “Relatório final sobre os fatos violentos ocorridos entre 18 de abril e 30 de maio de 2018”. No referido documento, confirmou as conclusões da visita de trabalho realizada pela Comissão entre 17 e 21 de maio, em relação ao uso excessivo da força policial para reprimir as manifestações, a participação de agentes parapoliciais, um padrão repressivo consistente na detenção de centenas de pessoas, e a negação de fornecer atenção médica de urgência aos feridos como forma de represália.

Além disso, o GIEI instalado pela CIDH concluiu que no Estado da Nicarágua foram perpetradas condutas no contexto de um ataque generalizado e sistemático contra a população civil, o qual, de acordo com o direito internacional, deve implicar que tais condutas constituem crimes contra a humanidade. Esta conclusão está baseada na quantidade de vítimas, na gravidade das ações de repressão, na existência de determinados padrões de conduta realizados com recursos do Estado, e no fato de que responderam a uma política definida e apoiada desde a cúpula do poder estatal. A CIDH faz suas as recomendações formuladas pelo GIEI ao Estado da Nicarágua para superar a crise atual do país, tais como: iniciar uma reforma integral das instituições estatais que garanta a não repetição das violações de direitos humanos; e estabelecer as reformas e os mecanismos necessários para garantir que os fatos violentos ocorridos desde 18 de abril sejam julgados por magistrados que garantam a imparcialidade.

Em virtude da configuração de crimes de lesa humanidade, as provas disponíveis sobre a crise de direitos humanos e a consequente alteração da ordem constitucional nicaraguense, a CIDH faz um apelo aos Estado Membros da OEA para que atuem de modo mais enérgico para assegurar o restabelecimento das condições e estruturas propícias para o gozo e a garantia dos direitos humanos na Nicarágua, conforme os princípios e valores consagrados na Carta Democrática desta Organização.

A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.

 

No. 006/19