CIDH

Comunicado de Imprensa

A CIDH apresenta o relatório “Direito da criança à família. Cuidado alternativo. Pondo fim à institucionalização nas Américas”

19 de fevereiro de 2014

Washington, D.C. – Desde a sua criação, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) tomou diversas medidas para assegurar a promoção e proteção dos direitos das crianças e adolescentes nas Américas. Neste contexto, a CIDH apresenta o relatório “Direito da criança à família. Cuidado alternativo. Pondo fim à institucionalização nas Américas”, no qual aborda uma problemática que é de especial preocupação na região: a situação na qual vivem as crianças que, por diversos motivos, não contam com os cuidados adequados em seu ambiente familiar e requerem medidas por parte do Estado para garantir seu bem-estar e seu desenvolvimento integral. A institucionalização das crianças continua sendo uma resposta habitual nos Estados da região a estas situações, ainda que as evidências demonstrem que o funcionamento atual de muitas instituições não garanta a proteção dos direitos das crianças que se encontram internadas nelas e as expõe a contextos de violência, abuso e tratos negligentes.

No presente Relatório a CIDH analisa em primeiro lugar o direito da criança a viver e ser criada por sua família e estabelece as obrigações que se derivam para os Estados no que se refere ao apoio e o fortalecimento das capacidades das famílias para criar e cuidar das crianças. Assim, a CIDH manifesta que não existe um conceito tradicional ou limitado de família, já que isso interferiria no direito à vida privada das pessoas; além disso, entende que na sociedade atual existem diversas modalidades de vínculos de caráter familiar.

O Relatório analisa as circunstâncias mais habituais no âmbito das quais se aplica uma medida de proteção que supõe separar a criança de sua família: entre elas, destacam-se a carência de recursos materiais da família da criança, a violência no seio familiar e a renúncia à guarda ou o abandono. A CIDH conclui que, apesar de que no âmbito do direito internacional dos direitos humanos se estabeleceu que a pobreza e a falta de meios materiais não deve ser a causa que motive a separação da criança de sua família, na prática, na região das Américas, a pobreza continua sendo o pano de fundo de muitos dos casos de ingresso de uma criança numa instituição. O presente Relatório também assinala a preocupação com o fato de que as crianças provenientes de setores sociais tradicionalmente excluídos, como as crianças afrodescendentes, aquelas pertencentes a povos indígenas e as crianças com alguma deficiência, estão super-representadas nas instituições.

Em matéria de padrões, a CIDH estabelece no Relatório que os princípios de excepcionalidade, necessidade e temporalidade devem vigorar na aplicação das medidas especiais de proteção que impliquem separar a criança de sua família. A interferência na vida privada familiar que implica o fato de separar uma criança de sua família deve ser feita conforme a lei e se basear em critérios objetivos, estar devidamente motivada com base nas avaliações especializadas realizadas por uma equipe multidisciplinar e atender ao interesse superior da criança. O relatório também assinala que, às vezes, a família pode constituir um ambiente violento ou que de outro modo afete negativamente o desenvolvimento integral da criança e seus direitos. Neste sentido, a CIDH sublinha que a intervenção das autoridades públicas através de uma medida de proteção nestas situações não contradiz o direito à vida familiar, mas surge como consequência direta da ausência dos cuidados parentais adequados e da obrigação de proteger e garantir os direitos das crianças que o Estado tem.

A CIDH estabelece que as medidas especiais de proteção devem considerar, em primeiro lugar, o acolhimento da criança dentro de sua família estendida ou ampliada, por ser a medida que mais respeita seus direitos e, caso não seja possível ou não seja no interesse da criança, considerar o acolhimento alternativo em uma família acolhedora. Em suas conclusões, a CIDH estabelece que o acolhimento de caráter institucional deveria limitar-se aos casos em que seja necessário e idôneo, atendendo ao interesse superior da criança e garantindo que não permanecerá em um centro de acolhimento residencial por mais tempo do estritamente necessário. Além disso, sugere a substituição das grandes instituições por centros de acolhimento de dimensões pequenas que possam prestar uma atenção personalizada e de qualidade numa dinâmica similar à familiar e em um contexto de proximidade da comunidade à qual pertence a criança.

A CIDH destaca sua preocupação com a atual ausência, na maioria dos Estados, de uma norma adequada que regule a criação e o funcionamento dos centros de acolhimento. A ausência de regulações estatais adequadas para este tipo de instituições apresenta gravíssimas consequências e problemas em termos das condições nas quais operam muitas delas, sem uma supervisão e controle adequados. Os motivos de preocupação que a CIDH manifesta no Relatório se vinculam, entre outros, à precariedade das instalações em termos de salubridade e segurança, superlotação, falta de pessoal capacitado para trabalhar com crianças, negligência no cuidado, violência e maus tratos, isolamento social e medicação psiquiátrica desnecessária ou utilização de formas de tratamento que constituem em si mesmas uma forma de violência.

A CIDH indica em suas recomendações a necessidade que os Estados regulem adequadamente o funcionamento dos centros de acolhimento e realizem uma vigilância adequada dos mesmos, devendo investigar e, se for o caso, punir as eventuais violações aos direitos das crianças que nelas ocorram. A CIDH insta os Estados a que procedam a estabelecer um processo organizado e planejado de desinstitucionalização de crianças e adolescentes, particularmente dos que se encontram na primeira infância e os que permanecem em instituições que não cumprem os padrões de proteção à infância, e que se identifiquem opções mais de acordo com seus direitos.

A Comissão convida os Estados, os representantes da sociedade civil e as crianças a divulgar o presente Relatório e oferece o apoio da Relatoria sobre direitos da infância neste esforço.

Este relatório foi elaborado no âmbito de um Convênio de Cooperação entre a CIDH e o UNICEF, no contexto de um acordo de colaboração entre a CIDH e o Escritório da Representante Especial do Secretário-Geral das Nações Unidas sobre a Violência contra as Crianças. A CIDH reconhece a contribuição de ALDEAS SOS para a tradução do presente relatório.

A CIDH é um órgão autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem o mandato de promover a observância dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na matéria. A CIDH é integrada por sete membros independentes que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal e não representam seus países de origem ou residência.

No. 14/14