Imprensa da CIDH
Washington D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e a Relatoria Especial sobre Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (REDESCA) acompanham com atenção a situação das violações sistemáticas de direitos humanos sofridas pelas pessoas que vivem em situação de rua nas Américas, que se agravou durante a pandemia. Diante dessa situação, a Comissão e a Relatoria Especial sobre DESCA fazem um apelo urgente aos Estados da região para que adotem medidas e políticas estruturais, com o máximo de recursos disponíveis, para garantir os direitos humanos dessas pessoas em situação de vulnerabilidade, com ênfase na garantia de seus direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais (DESCA), incluindo os direitos à moradia, saúde, previdência social, alimentação, água e saneamento, entre outros.
A CIDH e a REDESCA observam que as pessoas em situação de rua, entendidas como aquelas que carecem de moradia estável, segura e adequada - juntamente com a privação generalizada de outros direitos, fazem parte de um grupo em condição de vulnerabilidade que requer atenção especial. Isto considerando principalmente a situação de abandono e marginalização social em que se encontram, assim como o fato de não terem um lugar além do espaço público para desenvolver sua vida íntima e social.
Diante desta situação, a Comissão e a REDESCA observam que, conforme apontado pela ONU Habitat e pela Relatora Especial da ONU sobre moradia adequada, entre outros, essa situação, além de ter múltiplas causas complexas, também pode ser evidenciada de várias maneiras, incluindo não apenas viver em espaços abertos, como em vias públicas, mas também em veículos, em abrigos de emergência temporários, em acampamentos ou albergues temporários, bem como em moradias inadequadas e inseguras, como assentamentos informais.
Por outro lado, é importante observar que a pandemia teve um grande impacto sobre as pessoas que vivem em situação de pobreza e, mais ainda, sobre a população em situação de rua. Nesse sentido, de acordo com dados da CEPAL, houve um aumento acentuado nas taxas de pobreza extrema na região, o que se refletiu, entre outras coisas, no aumento de quase 5 milhões de pessoas somente entre 2020 e 2021. Assim, em 2021, a pobreza teria atingido 32,1% da população latino-americana - aproximadamente 201 milhões de pessoas - e a pobreza extrema teria chegado a 13,8% - 86 milhões de pessoas -. Isso teria alcançado níveis que não eram vistos há pelo menos uma década. A CEPAL também apontou que, durante a pandemia, os assentamentos informais precários e as pessoas que vivem nas ruas se multiplicaram.
Nesse contexto, a CIDH e a REDESCA expressam sua preocupação com a falta de dados desagregados sobre pessoas em situação de rua em nível regional, o que é um obstáculo para a compreensão do impacto diferenciado que a crise sanitária teve sobre esse grupo e para a implementação de políticas públicas para melhorar seu contexto habitacional. Nesse sentido, a ausência de um registro preciso e adequado constituiria, por si só, outra violação de seus direitos.
A Comissão e a REDESCA destacam que a falta de um lar, além de configurar uma forma de discriminação sistemática e de exclusão social para as pessoas atingidas, é um motivo adicional de discriminação para os coletivos ou grupos em uma situação de maior vulnerabilidade. Nesse sentido, as pessoas que sofrem discriminação por motivos de raça, idade, etnia, local de origem, status socioeconômico, situação familiar, gênero, deficiência mental ou física, estado de saúde, orientação sexual e/ou identidade de gênero têm maior probabilidade de enfrentar obstáculos no acesso a moradias temporárias ou permanentes em condições de habitabilidade, ficando expostas a viverem sem um lar e a sofrer as consequências de estarem sujeitas a maior estigmatização, criminalização, assédio ou outras ameaças caso estejam e/ou permaneçam em situação de rua.
Em vista dessa situação de vulnerabilidade das pessoas em situação de rua, a Comissão e a REDESCA enfatizam que, de acordo com os parâmetros universais e interamericanos, os Estados têm a obrigação imediata de adotar medidas deliberadas, concretas e direcionadas para garantir os DESCA sem discriminação, por todos os meios apropriados, incluindo a adoção de medidas legislativas. Para esse fim, são essenciais medidas que garantam a satisfação dos requisitos mínimos essenciais de cada um desses direitos. No caso particular do direito à moradia e das pessoas em situação de rua, os Estados devem adotar medidas para enfrentar a falta de moradia sistemática e a privação de moradia, conforme estabelecido pelo Conselho de Direitos Humanos em sua Resolução 37/4 de 2018.
Portanto, a Comissão e a REDESCA fazem um apelo enfático para que sejam tomadas medidas urgentes para garantir os direitos humanos, e particularmente os DESCA, das pessoas em situação de rua. Para essas medidas, é essencial adotar uma abordagem de direitos humanos, com perspectiva de gênero e interseccionalidade, que inclua políticas estruturais de caráter preventivo. A proteção social das pessoas em situação de rua deve ser uma prioridade para os Estados, que devem promover a conscientização de suas instituições, das forças de segurança e da sociedade como um todo sobre os direitos humanos da população, buscando gerar solidariedade com as circunstâncias e os traumas vividos pelas pessoas sem teto.
Por fim, os Estados são chamados a combater a estigmatização e a discriminação contra as pessoas em situação de rua, bem como a adotar políticas econômicas e fiscais que garantam soluções sustentáveis de longo prazo para essa situação. Nessa linha, devem dar atenção especial a desafios como o aumento excessivo dos custos de moradia, os despejos forçados, os impactos das emergências climáticas, os desastres naturais, entre outros. Por fim, para possibilitar políticas públicas eficazes, recomenda-se um levantamento de dados abrangente e desagregado sobre as pessoas em situação de rua, o que torna visível seu contexto habitacional e permite um monitoramento detalhado do progresso das medidas implementadas.
A REDESCA é um escritório autônomo da CIDH, criado especialmente para fortalecer a promoção e a proteção dos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais nas Américas, liderando os esforços da Comissão nessa área.
A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato decorre da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem o mandato de promover a aplicação e a defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA nesta área. A CIDH é composta por sete membros independentes que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA de forma pessoal, e não representam seus países de origem ou residência.
No. 085/23
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