Imprensa da CIDH
Washington, D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) manifesta sua profunda preocupação com a decisão do Tribunal Constitucional (TC) do Peru que, em conformidade com o anúncio oficial, restituiu os efeitos da Resolução Suprema de 24 de dezembro de 2017, por meio da qual se concedeu um indulto humanitário ao ex-Presidente do Peru, Alberto Fujimori e se ordenou sua libertação, depois de ter sido condenado por crimes contra a humanidade. A restituição do indulto resultaria na libertação de Fujimori e na extinção da sua pena, o que viola os direitos das vítimas de crimes de lesa humanidade, viola o seu acesso à justiça e lesiona sua dignidade, assim como gera obstáculos para o cumprimento integral das sentenças da Corte Interamericana nos casos Barrios Altos e La Cantuta vs. Peru.
Alberto Fujimori foi condenado a 25 anos de pena privativa de liberdade, em sentença confirmada pela Câmara Criminal da Corte Suprema de Justiça, emitida em 30 de dezembro de 2009, pelo massacre de quinze pessoas em Barrios Altos, e pelo desaparecimento forçado e execução de dez estudantes da Universidade La Cantuta; assim como o sequestro de Gustavo Gorriti e Samuel Dyer. As sentenças da Corte nos dois primeiros casos, assim como os respectivos relatórios sobre o mérito da CIDH, consideraram o Estado do Peru responsável pela violação do direito à vida, à integridade pessoal e à proteção judicial, entre outros, estabelecidos na Convenção Americana. Em consequência, determinou ao Estado investigar, julgar e, se for o caso, sancionar os responsáveis pelos fatos.
Após o indulto concedido de maneira discricionária pelo Executivo no ano de 2017, a Corte Interamericana estabeleceu, em sua Resolução de supervisão de cumprimento de 2018, a sua inconvencionalidade, uma vez que, fixada uma pena em um processo penal por graves violações aos direitos humanos, o perdão posterior leva a uma violação ainda maior do direito de acesso à justiça das vítimas; e determinou ao Estado analisar outras medidas que permitam proteger a vida e a integridade de Fujimori. Diante do exposto, e por solicitação das vítimas, a Corte Suprema de Justiça do Peru tornou sem efeitos o indulto. Quanto ao indulto concedido a Alberto Fujimori em 2017, a CIDH expressou sua profunda preocupação, porque ao suprimir os efeitos das sentenças condenatórias relativas a crimes de lesa humanidade e graves violações de direitos humanos em seu benefício, o Estado peruano descumpriu as disposições das sentenças da Corte Interamericana e ignorou suas obrigações internacionais. A concessão do indulto não levou em consideração as particularidades dos crimes de lesa humanidade, nem os direitos das vítimas.
Conforme as informações recebidas pela CIDH, existem três recursos de habeas corpus que buscam reverter a decisão da Corte Suprema. Um deles, interposto por supostas violações à integridade pessoal, ao direito a não ser submetido à tortura e outros tratamentos cruéis, assim como pela exposição à contaminação ambiental e ao corona vírus, foi declarado improcedente em primeira instância no dia 21 de abril de 2020.
Tal decisão foi confirmada em segunda instância pela Corte Superior de Justiça de Ica, em cuja decisão, de 22 de maio de 2020, se afirma que "da leitura integral da demanda se depreende que a verdadeira pretensão do demandante é que se determine a libertação do beneficiário, declarando-se nula a resolução judicial que declarou nulo o indulto humanitário que lhe fora concedido". Em 1 de junho de 2020, o recorrente interpôs um recurso de agravo constitucional perante o Tribunal Constitucional, dentro do mesmo processo de habeas corpus, questionando a decisão de segunda instância. Em 17 de março, o TC comunicou que, em sessão do pleno, se declarou bem fundamentada a demanda nos termos indicados.
A CIDH lembra que, em 2011, a Corte Interamericana de Direitos Humanos concluiu que os crimes praticados no caso La Cantuta são crimes de lesa humanidade. Do mesmo modo, em 2001, no âmbito do caso Barrios Altos, a Corte classificou as ações praticadas pelo ex-mandatário como graves violações aos direitos humanos.
Os órgãos do Sistema Interamericano de Direitos Humanos estabeleceram que a concessão indevida de benefícios na execução da pena pode resultar em uma forma de impunidade, especialmente quando se trata de graves violações aos direitos humanos. A Comissão destacou, além disso, que o direito internacional proíbe a aplicação de anistias, indultos e outras excludentes de responsabilidade a pessoas que foram declaradas culpadas pela prática de crimes de lesa humanidade. Em consequência, a CIDH reitera que o anúncio oficial de restituição dos efeitos do indulto concedidos na Resolução Suprema de 24 de dezembro de 2017 seria uma decisão contrária às obrigações internacionais do Estado do Peru, e destaca a obrigação do Estado de adotar as medidas necessárias para restabelecer os direitos das vítimas, e seus familiares, atingidos com essa decisão.
A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.
No. 054/22
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