Imprensa da CIDH
Washington D.C.- A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) condena o conjunto de ações estatais realizadas nos últimos meses de forma sistemática com o objetivo de impedir a participação da oposição nas eleições gerais a serem realizadas na Nicarágua em novembro deste ano, bem como a persistência de violações de direitos humanos neste contexto. A CIDH insta o Estado a cessar a repressão contra pessoas que se opõem ao governo e a tomar medidas para garantir as condições necessárias para a realização de eleições livres, justas e transparentes no país.
Dentre as ações estatais realizadas nos últimos meses com o objetivo de impedir a participação da oposição, a CIDH, através de seu Mecanismo Especial de Acompanhamento para a Nicarágua (MESENI) destaca: a detenção e criminalização de lideranças, incluindo pessoas pré-candidatas presidenciais através da aprovação e utilização de leis penais de conteúdo ambíguo e/ou que restringem arbitrariamente os direitos políticos da população nicaraguense; e, de forma geral, o aprofundamento de um Estado policial que mantém a suspensão dos direitos e liberdades públicas.
A CIDH condenou as detenções arbitrárias de 31 pessoas, ocorridas nos últimos dois meses, incluindo as de Cristiana Chamorro, Arturo Cruz, Félix Maradiaga, Juan Sebastián Chamorro, Miguel Mora, Medardo Mairena e Noel Vidaurre, que foram detidos e estão privados de liberdade uma vez que anunciaram publicamente sua intenção de concorrer à presidência, impedindo-os assim de continuar e formalizar sua participação no processo eleitoral.
Neste contexto de fechamento dos espaços de participação da oposição nas eleições, no dia 2 de agosto de 2021, data de encerramento do prazo para a apresentação e registro de candidaturas à presidência e vice-presidência da República da Nicarágua, o atual chefe do Executivo anunciou, juntamente com a vice-presidente, a formalização de sua candidatura para um quarto mandato consecutivo à frente do Poder Executivo.
Além disso, no dia 3 de agosto, a CIDH condenou a prisão domiciliar, a restrição migratória e a proibição de concorrer a cargos públicos de Berenice Quezada, candidata da oposição à vice-presidência pela Alianza Ciudadanos Por la Libertad, o que ocorreu no dia seguinte ao anúncio de sua candidatura. No dia 5 de agosto, o Ministério Público informou que as acusações contra Berenice Quezada se baseiam em supostos atos que se enquadram no crime de "provocação, proposição e conspiração para cometer atos terroristas". Além disso, o Ministério Público indicou que ela permaneceria em liberdade durante o processo.
A CIDH também expressou sua preocupação com a desconsideração arbitrária da personalidade jurídica de dois partidos da oposição, incluindo o Partido da Restauração Democrática (PRD), que estava colaborando com a Coalizão Nacional para a seleção de uma candidata da oposição.
Além disso, no dia 6 de agosto, o Conselho Supremo Eleitoral (CSE) cancelou o status jurídico do partido Cidadãos pela Liberdade, o que eliminaria a candidatura do único pré-candidato da oposição que havia conseguido se registrar formalmente para as próximas eleições presidenciais. Em sua decisão, o CSE também solicitou o cancelamento da carteira de identidade nicaraguense da presidente do partido, Kitty Monterrey. No dia 8 de agosto, o Ministério do Interior confirmou o cancelamento da nacionalidade nicaraguense, assim como da carteira de identidade, da certidão de nascimento e o cancelamento do passaporte da presidente do partido, que possui outra nacionalidade e, até o momento, estaria escondida por medo de ser detida e/ou deportada.
A este respeito, a CIDH condena veementemente a resolução do CSE, que foi adotada em contravenção à Constituição da Nicarágua e fundamentada na Lei de Regulação dos Agentes Estrangeiros e na Lei de Defesa dos Direitos dos Povos à Independência, Soberania e Autodeterminação para a Paz. Como observado pela CIDH, estas normas restringem arbitrariamente a competição eleitoral, o exercício dos direitos políticos e outros direitos, como a liberdade de expressão e de associação.
A CIDH tem enfatizado que o uso do processo penal para perseguir as pessoas opositoras e pré-candidatas presidenciais viola de diversas formas o direito à liberdade pessoal, o princípio da legalidade, a presunção de inocência, o direito de ser julgado por um juiz imparcial, e outras garantias do devido processo legal. Como resultado, tanto a CIDH quanto a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) ordenaram ao Estado nicaraguense que adotasse medidas cautelares e provisionais para proteger a vida e a integridade física de algumas das pessoas presas. Até hoje, o Estado não cumpriu as medidas ordenadas, assim como não cumpriu com a libertação das pessoas privadas de liberdade.
Estes fatos confirmam a ruptura do Estado de Direito na Nicarágua, com base na concentração do poder no Executivo e no enfraquecimento progressivo das instituições democráticas no país, fatos que a Comissão vem apontando e condenando de forma sustentada nos últimos anos, assim como a situação de impunidade estrutural das graves violações dos direitos humanos ocorridas desde 18 de abril de 2018.
A Comissão reitera o seu apelo ao Estado para libertar todas as pessoas detidas arbitrariamente no contexto dos protestos ou em razão dos mesmos. Também insta o Estado a cumprir as medidas provisionais concedidas pela Corte IDH, assim como a revogar todas as regulamentações que limitem arbitrariamente o exercício dos direitos políticos e liberdades públicas, e a permitir o registro das candidaturas correspondentes; além disso, a restabelecer um ambiente de liberdades e respeito aos direitos políticos. Isto, a fim de garantir a realização de eleições livres, justas e transparentes, de acordo com as recomendações feitas pela comunidade internacional, incluindo a Missão de Observação Eleitoral da OEA (MOE/OEA) em 2017, e as resoluções do Conselho Permanente e da Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos. Finalmente, a CIDH insta o Estado da Nicarágua a pôr fim à impunidade e a adotar as medidas necessárias para superar a crise e restabelecer a institucionalidade democrática através de processos que promovam a verdade, a justiça e a reparação às vítimas da grave crise que o país está atravessando.
A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.
No. 209/21
10:28 AM