COMUNICADO CONJUNTO
Relator Especial das Nações Unidas (ONU) sobre a Proteção e Promoção
do Direito à Liberdade de Opinião e Expressão
Relatora Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão
Interamericana de Direitos Humanos da OEA
Declaração Conjunta sobre Violência contra Jornalistas e Comunicadores
no Contexto de Manifestações Sociais
13 de setembro de 2013 – O Relator Especial das Nações Unidas (ONU) para a Liberdade de Opinião e de Expressão, Frank La Rue, e a Relatora Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, Catalina Botero, têm observado com preocupação a forma como algumas autoridades estatais reagiram frente às manifestações sociais ocorridas nas Américas nos meses recentes. Em geral, os participantes das manifestações se manifestaram de forma pacífica, ainda que tenham sido reportados casos de violência. Nesse contexto, os relatores especiais têm sido informados sobre dezenas de detenções, ameaças e agressões cometidas contra jornalistas, comunicadores, manifestantes e usuários de redes sociais que faziam a cobertura sobre as manifestações.
Os relatores especiais observam que no contexto de manifestações e situações de alta conflituosidade social, o trabalho de jornalistas e comunicadores, e o livre fluxo de informações por meios alternativos como as redes sociais, são fundamentais para manter a população informada sobre os acontecimentos, cumprindo um importante papel ao relatarem sobre a atuação do Estado e da Força Pública diante das manifestações, prevenindo assim o uso desproporcional da força e o abuso da autoridade.
Os ataques contra jornalistas que cobrem essas situações viola tanto o aspecto individual da liberdade de expressão – pois eles são impedidos de exercer seu direito a buscar e difundir informações, o que gera um efeito amedrontador – quanto o seu aspecto coletivo – pois a sociedade é privada do direito de conhecer as informações que os jornalistas obtêm. Por essa razão, as relatorias têm reconhecido que em função da importância do trabalho prestado pelos jornalistas que cobrem essas situações, o Estado deve outorgar-lhes o máximo grau de garantias para que cumpram sua função. Esse dever não se limita a outorgar medidas concretas de proteção para os comunicadores. Inclui também a obrigação de criar as condições necessárias para mitigar o risco do exercício da profissão nessas situações.
O Estado tem o dever de garantir que os jornalistas e comunicadores que estejam realizando o seu trabalho informativo em um contexto de manifestação pública não sejam detidos, ameaçados, agredidos ou restringidos de qualquer forma em seus direitos por estarem exercendo sua profissão. Seu material e suas ferramentas de trabalho não devem ser destruídos ou confiscados pelas autoridades públicas. Como se afirmou no pronunciamento sobre as agressões e detenções cometidas contra jornalistas pela ocasião das manifestações de Occupy nos Estados Unidos, a proteção do direito à liberdade de expressão exige que as autoridades assegurem as condições necessárias para que os(as) jornalistas possam cobrir fatos de notório interesse público, como os que se referem às manifestações sociais. As restrições desproporcionais no acesso ao lugar dos fatos, as detenções e a imputação de acusações pelo cumprimento dos trabalhos profissionais dos(das) repórteres viola o direito à liberdade de expressão. Cabe às autoridades restabelecer as garantias prejudicadas e assegurar o pleno respeito ao direito à liberdade de expressão.
Os relatores especiais observam que para realizar seu trabalho de modo efetivo, os(as) jornalistas devem ser percebidos(as) como observadores(as) independentes e não como potenciais testemunhas para os órgãos de justiça. Do contrário, os jornalistas podem sofrer ameaças à sua segurança e à segurança de suas fontes. Em situações de especial conflituosidade social, a percepção de que pode ser forçado(a) a declarar não só restringe a possibilidade de o(a) jornalista acessar as fontes de informação, mas também aumenta o risco de que ele(a) se converta em um alvo para grupos violentos. Por outro lado, as autoridades não devem exigir que os jornalistas demonstrem que as declarações das testemunhas divulgadas sobre os fatos são exatas ou que provem perante um juiz a veracidade das denúncias reportadas.
O Estado não deve proibir ou criminalizar as transmissões ao vivo dos fatos e deve se abster de impor medidas que regulem ou restrinjam a livre circulação de informações pela internet e demais plataformas de comunicação. Do mesmo modo, as autoridades não devem estigmatizar ou estereotipar os manifestantes e suas reivindicações, evitando fazer generalizações com base no comportamento de grupos particulares ou fatos isolados. Nesse sentido, as autoridades devem considerar que os funcionários públicos têm uma posição de garante dos direitos fundamentais das pessoas, e, por isso, suas declarações não podem constituir formas de ingerência direta ou indireta nos direitos dos que pretendem contribuição à deliberação pública por meio da expressão e difusão de informações. Esse dever se vê particularmente acentuado em situações de maior conflituosidade social, alterações da ordem pública ou polarização social ou política, precisamente pelo conjunto de riscos que elas podem gerar para determinadas pessoas.
A esse respeito, os relatores especiais salientam que é fundamental que as autoridades condenem energicamente as agressões contra os jornalistas e comunicadores, e atuem com a devida diligência e celeridade no esclarecimento dos fatos e na punição dos responsáveis. Do mesmo modo, os relatores especiais observam que instruir adequadamente as forças de segurança do Estado sobre o papel da imprensa em uma sociedade democrática constitui um passo importante para prevenir a violência contra jornalistas e trabalhadores de meios de comunicação em situações de conflituosidade social.
Os direitos de reunião e liberdade de expressão, garantidos na Convenção Americana sobre Direitos Humanos e no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos são fundamentais e sua garantia é uma condição necessária para a existência e o funcionamento de uma sociedade democrática. Um Estado pode impor restrições razoáveis às manifestações com o objetivo de assegurar o desenvolvimento pacífico das mesmas ou dispersar aquelas que se tornarem violentas, sempre que tais restrições forem regidas pelos princípios de legalidade, necessidade e proporcionalidade. Ademais, a dispersão de uma manifestação deve ser justificada pelo dever de proteção das pessoas, e deve utilizar as medidas mais seguras e menos lesivas para os manifestantes. O uso da força em manifestações públicas deve ser excepcional e em circunstâncias estritamente necessárias, conforme os princípios internacionalmente reconhecidos.