Nota à Imprensa


Declaração da Secretaria-Geral da OEA sobre CICIES

  7 de junho de 2021

A Secretaria-Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA) lamenta profundamente o Comunicado de Imprensa do Ministério das Relações Exteriores de El Salvador, de 4 de junho de 2021, pelo qual rompe o acordo da Comissão Internacional contra a Impunidade em El Salvador (CICIES), bem como as razões expostas na referida declaração.

O comunicado indica que a decisão “se deve ao fato de que a Secretaria-Geral da OEA contratou como assessor o ex-prefeito de San Salvador, do partido Arena, Ernesto Muyshondt, que desde 2016 é processado por diversos crimes" e que o CICIES foi criado para "lutar contra a corrupção e a impunidade e não para as promover ”.

A Secretaria-Geral da OEA sente que tem o dever de informar:

a) O Sr. Ernesto Muyshondt não foi contratado conforme consta em sua declaração, mas apenas fez proposta na ocasião por um contrato honorário, embora este contrato nunca tenha sido assinado.

b) Antes de tornar pública a oferta, o Ministério das Relações Exteriores foi informado a respeito e em nenhum momento divulgou qualquer divergência quanto à possibilidade de realizá-la.

c) Como é óbvio, mais do que óbvio, nos conhecimentos elementares de direito diplomático e prática diplomática, nem mesmo a contratação teria dado ao Sr. Ernesto Muyshondt imunidade perante os tribunais salvadorenhos, muito menos “impunidade”. Esses erros de enredo são inadmissíveis de todos os pontos de vista.

d) Deve ficar claro que o Sr. Muyshondt não teve, não tem e não terá contrato com a Organização. A Secretaria-Geral não quer que isso seja usado como desculpa para a CICIES deixar o país (sem prejuízo de eventualmente considerar as reclamações feitas pelo Sr. Muyshondt sobre violação das garantias do devido processo, a saber: preconceito do caso por membros do poder executivo, linchamento em redes, apelo ao ativismo político para pressionar as sedes judiciais, etc.).

Portanto, e em vista do exposto, rejeitamos totalmente o argumento formulado e nos consideramos no dever de tornar públicas nossas divergências com o Governo de El Salvador a respeito da CICIES. Essas diferenças eram do conhecimento dos doadores e do próprio Governo de El Salvador, que fora informado de que elas impossibilitavam a continuação do trabalho da Comissão.

Em primeiro lugar, a aprovação da Lei para a utilização de produtos para tratamentos médicos em situações excepcionais de saúde pública provocadas pela pandemia COVID-19, promulgada por meio do decreto legislativo n.º 7 de 5 de maio de 2011 e publicado no Diário da República. 85 Volume 431 da mesma data, 5 de maio de 2021, eventualmente beneficia pessoas que poderiam ter participado de atos de corrupção em razão da imunidade estabelecida no art. 4º da referida lei e o CICIES não poderia continuar trabalhando em um quadro de eventual impunidade.

Em segundo lugar, a decisão do governo de não tornar público o Primeiro Relatório Descritivo sobre a Qualidade, Eficácia e Legitimidade do Uso de Fundos Públicos em resposta à pandemia COVID-19. No referido Relatório, constata-se uma série de irregularidades com aspecto criminoso que devem ser investigadas.

Terceiro, a asfixia que a Procuradoria-Geral da República tem perpetrado contra o CICIES nas últimas semanas, restringindo completamente suas possibilidades investigativas.

Em quarto lugar, as ações do governo visam impedir o progresso nas investigações sobre as denúncias de corrupção do atual governo.

Em quinto lugar, e com base no exposto, a necessidade de aprovação de uma reforma do código de processo penal para que organizações intergovernamentais como a CICIES possam ser demandantes nos processos penais e investigações que a Procuradoria Geral da República proceda nesses casos de corrupção que afetam os direitos difusos da população.

Em sexto lugar, a atitude recorrente do Governo de tentar induzir as CICIES a investigar exclusivamente as ações dos políticos da oposição. Isso é absolutamente inadmissível e contrário ao compromisso que a Secretaria-Geral assumiu de que as CICIES jamais seriam um instrumento de perseguição política por parte do Governo.

A Secretaria-Geral da OEA considerou e fez saber ao Governo e aos doadores que sem esses elementos "a luta contra a corrupção" é mais um esforço retórico do que um objetivo político e ético, o que impossibilita a CICIES de acompanhar esse processo.

O atual Governo de El Salvador sabe que a Secretaria-Geral da OEA sempre assumiu os princípios essenciais do Direito Interamericano e do Sistema Interamericano, embora em muitos casos tenha sido a única na defesa desses princípios. Mesmo assim, podem ter certeza de que a OEA continuará a apoiá-los, independentemente dos custos políticos que isso acarrete.

Referencia: P-059/21