Imprensa da CIDH
Washington D.C. – No segundo aniversário da sentença no caso Dobbs vs. JWHO, que eliminou o direito de acessar serviços de saúde relacionados ao aborto, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) expressa sua preocupação com a proliferação de marcos normativos, práticas e outros obstáculos que impedem o acesso a serviços de saúde reprodutiva nos Estados Unidos. A CIDH urge ao Estado que proteja o direito à vida, saúde e integridade pessoal de mulheres e pessoas gestantes.
Dois anos após a sentença da Suprema Corte, aproximadamente 33 estados possuem legislação que proíbe ou restringe o acesso a serviços de saúde relacionados ao aborto em diversos níveis. A inconsistência, ambiguidade e falta de clareza de algumas dessas regras levou a incertezas entre os profissionais de saúde sobre o que é legal ou não, comprometendo a qualidade do serviço prestado devido ao medo de serem sancionados. Isso inclui situações em que a negação ou o atraso no atendimento médico, mesmo em casos de emergência, resultou em danos à saúde física e emocional das mulheres, que poderiam ser evitadas.
Além disso, a Comissão recebeu relatos de que o aumento do assédio, violência e ameaças contra profissionais e estabelecimentos de saúde que fornecem esses serviços levou muitos profissionais de saúde a abandonar ou evitar exercer sua prática médica em estados onde o aborto é proibido ou restrito. Isso resultou no fechamento não apenas de clínicas de aborto, mas também de seções de maternidade nos hospitais. Essas consequências afetam de maneira desproporcional mulheres e pessoas gestantes negras e indígenas, que já enfrentavam, em média, taxas mais altas de mortalidade materna no país.
Consequentemente, dependendo da lei estadual, as mulheres que buscam serviços de saúde reprodutiva têm tido que se deslocar para estados onde podem acessá-los, resultando na saturação e atraso na prestação desses serviços também nesses estados. Devido aos custos associados a esses deslocamentos, para as mulheres e adolescentes de baixa renda ou em situação de pobreza, viajar para estados onde o aborto é permitido geralmente não é possível, o que exacerba as disparidades sociais e de saúde existentes.
Da mesma forma, a falta de certeza legal também afeta o acesso a outros serviços de saúde para as mulheres. Por exemplo, foram reportados atrasos na prescrição de tratamentos contra o câncer devido ao risco de causar a interrupção da gravidez. Além disso, há o temor de que a linguagem abrangente utilizada em algumas legislações limite o acesso a anticoncepcionais. Outra preocupação são os relatos de que os registros de prescrições médicas estão sendo compartilhados com as autoridades sem ordem judicial, com o objetivo de promover perseguição legal.
A proteção da saúde reprodutiva é essencial para o desenvolvimento autônomo das mulheres. O Estado tem a obrigação de fornecer serviços, instalações e bens de saúde que considerem as necessidades específicas das mulheres, além de incorporar uma perspectiva de gênero que permita o acesso real, de qualidade e adequado a esses serviços. Além disso, deve-se garantir um atendimento integral e adequado de acordo com as melhores práticas científicas e médicas, visando prevenir e tratar as complicações médicas relacionadas à gravidez. Nesse contexto, o acesso ao aborto seguro – considerado um serviço essencial de saúde pela Organização Mundial da Saúde (OMS) – assim como a outros serviços de saúde necessários exclusivamente para pessoas gestantes, é uma questão de igualdade de gênero.
A Comissão valoriza os esforços do Governo para salvaguardar os direitos reprodutivos protegidos a nível federal e para mitigar o impacto das normas proibitivas de aborto a nível estadual. Ao mesmo tempo, e em linha com o recomendado por diversos órgãos de tratados da ONU, insta à implementação das diretrizes da OMS sobre atenção ao aborto de 2022. Isso implica eliminar as sanções para aqueles que forneçam, assistam ou procurem esse serviço de saúde, e reforçar as proteções ao sigilo profissional do pessoal médico e à confidencialidade das pacientes.
Os Estados Unidos devem redobrar esforços para assegurar o acesso das mulheres a todos os serviços de saúde reprodutiva, incluindo informações verídicas e baseadas em evidências científicas sobre métodos anticoncepcionais, contracepção de emergência e pílulas abortivas, bem como o acesso e uso seguro destes em todo o território nacional.
A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato deriva da Carta da OEA e da Convenção Americana de Direitos Humanos. A Comissão Interamericana está mandatada para promover a observância dos direitos humanos na região e atuar como órgão consultivo da OEA sobre o assunto. A CIDH é composta por sete membros independentes, eleitos pela Assembleia Geral da OEA em caráter pessoal, e não representam seus países de origem ou residência.
No. 147/24
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