A CIDH chama o México a assegurar que qualquer modificação na Lei Orgânica da Procuradoria Geral da República seja debatida com ampla participação cidadã e se adeque aos compromissos internacionais em direitos humanos

22 de fevereiro de 2021

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Washington, D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) chama o Estado mexicano a assegurar que qualquer modificação na Lei Orgânica da Procuradoria Geral da República (LOFGR) seja debatida com ampla participação cidadã, aplicando o enfoque de direitos humanos e de modo consistente com seus compromissos internacionais na matéria.

De acordo com informações de conhecimento público, em 7 de outubro de 2020 apresentou-se ao Senado da República uma inciativa legislativa para a aprovação de uma nova Lei da Procuradoria Geral da República, que busca reformar diversas disposições legais que regulam suas competências em matéria de direitos humanos e cujo processo legislativo será retomado em breve.

A CIDH reconheceu que a adoção da LOFGR, em dezembro de 2018, e que está atualmente em vigor, foi resultado do trabalho de uma coalizão de diferentes organizações que solicitaram ao Estado que convocasse um diálogo nacional e organizasse mesas de trabalho para planejar conjuntamente uma Procuradoria independente, autônoma e profissional que garantisse o acesso à justiça e cumprisse efetivamente com os seus deveres de investigação. Precisamente, como resultado dessa construção coletiva, a nova Lei Orgânica dispôs que a revisão do modelo da Procuradoria e da política criminal deve se realizar de modo público e participativo. Nesse sentido, o Estado acrescentou que tais modificações respondem à experiência adquirida durante o primeiro ano de vigência da Lei.

Recentemente, a Comissão tomou conhecimento de que, perante a solicitação cidadã de se realizar um parlamento aberto com relação à iniciativa legislativa, o Senado optou por abrir um questionário na internet entre 21 de dezembro de 2020 e 6 de janeiro de 2021, cuja natureza poderia limitar a participação da cidadania em conformidade com os parâmetros interamericanos. Nesse sentido, à luz do direito à participação cidadã consagrado na Convenção Americana sobre Direitos Humanos, a CIDH afirmou que a participação ativa das pessoas na tomada de decisões públicas é um direito exigível e uma obrigação do Estado. Para a CIDH, não basta gerar mecanismos de consulta e deliberação para que a participação efetiva seja estimulada; é preciso incorporar as contribuições que dela emanam. Os parâmetros interamericanos se referem igualmente à importância em se incluir as vítimas de violações de direitos humanos na elaboração dos programas de reparações. Nesse sentido, se afirma que a participação da cidadania permite que se incorporem novas experiências, perspectivas e pontos de vista das pessoas e grupos que são titulares dos direitos que se buscam salvaguardar.

A Comissão reitera ao Estado a importância dos princípios de participação social e de produção e acesso à informação como garantia de transparência e prestação de contas na construção de políticas públicas com enfoque de direitos humanos. Pouco mais de dois anos da sua aprovação, o Estado é encorajado a assegurar que qualquer proposta de modificação da LOFGR ocorra no marco de um diálogo amplo, devidamente informado e participativo e que ative, de boa-fé, os mecanismos institucionais de participação cidadã para que as mudanças que sejam adotadas fortaleçam o respeito e a garantia dos direitos humanos e sejam o resultado de um processo aberto, deliberativo e amplamente participativo.

Por outro lado, organizações da sociedade civil e organizações internacionais de direitos humanos, como o Comitê Internacional da Cruz Vermelha e mecanismos especiais das Nações Unidas, manifestaram sua preocupação com o impacto das possíveis modificações, que afetariam as garantias judiciais das vítimas, a participação da Procuradoria Geral da República em órgãos de coordenação interinstitucional em matéria de direitos humanos, e a busca de pessoas desaparecidas, tudo em contravenção às obrigações internacionais de direitos humanos contraídas pelo Estado mexicano.

Quanto ao impacto sobre as garantias judiciais das vítimas e familiares, baseado em informações públicas, a proposta de modificação poderia limitar excessivamente ou até suprimir o direito de participação das vítimas na elaboração de planos de investigação, assistência a diligências, apresentação de provas periciais ou acesso a um tradutor ou intérprete, entre outros direitos existentes. Nesse sentido, a CIDH lembra ao Estado mexicano que tais aspectos do direito às garantias judiciais e à proteção judicial se encontram consagrados na Convenção Americana. Do mesmo modo, a garantia do mérito pessoal e a capacidade profissional na seleção de operadores de justiça são pressupostos essenciais para assegurar o acesso à justiça. Sem prejuízo do acima descrito o Estado mencionou que as garantias judiciais das vítimas e familiares estão previstas em outras leis e que não são objeto de qualquer reforma ou modificação.

A Comissão destaca a relevância do papel da Procuradoria Geral da República em múltiplos órgãos de coordenação interinstitucional em matéria de proteção a jornalistas e pessoas defensoras, de prevenção e sanção do tráfico de pessoas, de direito das mulheres e de busca de pessoas desaparecidas já que as instituições de procuradoria da justiça desempenham um mandato normativo fundamental na prevenção, investigação e sanção das violações aos direitos. Portanto, expressa sua preocupação em face de eventuais modificações que excluam a Procuradoria Geral da República de tais órgãos. Sobre isto, o Estado afirmou que não propõe a saída da Procuradoria desses espaços, mas sim a mudança na sua forma de colaborar e se coordenar, em atenção à sua qualidade de órgão autônomo. A Comissão lembra ao Estado mexicano que a integralidade do cumprimento das suas obrigações de direitos humanos supõe o diálogo, a coordenação, e o trabalho conjunto dos diversos setores do Estado.

Por último, a CIDH registra com especial atenção os pronunciamentos emitidos pela Comissão Nacional de Busca e pelo Sistema Nacional de Busca (SNB) que alertam sobre a saída da Procuradoria do SNB, a revogação das hipóteses de competência federal para a investigação dos delitos de desaparecimento forçado e desaparecimento praticado por particulares, assim como a supressão da obrigação expressa da Procuradoria Geral da República e dos Procuradores das entidades federativas de se coordenarem com as comissões de busca. Nesse sentido, a Comissão ressaltou a importância da complementariedade e inter-relação entre a busca e a investigação, bem como a necessária coordenação interinstitucional para uma busca efetiva; e lembra o Estado mexicano que, desde um enfoque de direitos humanos, a política pública sobre buscas deve ser transparente e visível, devendo ser construída e implementada em todas suas etapas e alcances com a participação das vítimas e organizações da sociedade civil. Ainda, reitera o dever do Estado de garantir a coordenação de todos os órgãos e entidades cuja cooperação seja necessária para uma busca efetiva, exaustiva e célere, assim como de eliminar os possíveis obstáculos internos que impeçam dita coordenação interinstitucional.

A Comissão insta o México a debater amplamente as reformas à normativa que regula a LOFGR, de tal modo que garanta um processo aberto e transparente de discussão legislativa, que considere as iniciativas e inquietudes da cidadania e que permita avaliar o impacto das possíveis modificações em suas obrigações internacionais de direitos humanos. A CIDH manifesta sua disposição para colaborar com o Estado através da cooperação técnica com o fim de que o princípio de participação social seja incorporado nas políticas públicas e de fortalecer a institucionalidade para garantir os direitos à verdade, justiça e reparação das vítimas.

A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.

No. 037/21