Imprensa da CIDH
Washington, D.C.- A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) adotou em 4 de janeiro de 2021 sua Resolução 1/2021, por intermédio da qual concedeu medidas cautelares em favor dos membros dos Povos Indígenas Guajajara e Awá da Terra indígena Araribóia. Os solicitantes alegaram que as pessoas beneficiárias se encontram em uma situação de risco no contexto da pandemia de COVID-19, considerando em especial sua situação de peculiar vulnerabilidade, falhas nos cuidados à saúde e a presença de terceiros não autorizados em seu território, com destaque para a especial vulnerabilidade do povo indígena Awá, em isolamento voluntário.
No momento de se pronunciar sobre o requisito da gravidade, a Comissão levou em conta que os fatos alegados estão demarcados em um contexto particular, caracterizado não apenas pela pandemia COVID-19, mas também por uma alegada situação histórica de violência contra os integrantes dos povos indígenas Guajajara e Awá em virtude de atividades de defesa dos seus direitos. Nesse sentido, a Comissão observou as informações concedidas pelos solicitantes com respeito a diversos assassinatos ao longo dos anos, identificando pelo menos 5 deles de modo recente. A CIDH também levou em consideração o alegado sobre o impacto na saúde dos povos indígenas, o que está relacionado à elevada presença de terceiros que realizam atividades ilegais nos seus territórios; o que, ao seu critério, aponta para uma situação de especial vulnerabilidade às pessoas integrantes dos povos indígenas que vivem no interior da Terra Indígena Araribóia.
Somando-se ao acima mencionado, segundo a solicitação, o Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Maranhão, responsável pela atenção à saúde das pessoas beneficiárias, já em princípios de julho de 2020 se apresentava como epicentro de casos positivos de COVID-19 entre os povos indígenas dessa região. Com efeito, a Comissão observou que, segundo as informações disponíveis apresentadas pelas partes, teria havido entre 25 e 69 falecimentos por COVID-19 confirmados em um suposto cenário de subnotificação, com uma estimativa de contágio de 50% da população Guajajara, segundo a Frente de Proteção Etnoambiental Awá. Ainda, conforme informações aportadas pelo próprio Estado, até agosto de 2020, mais de 8% da população da TI Araribóia já teria sido diagnosticada com COVID-19 (1.394 casos positivos); e em setembro teria sido identificado que os DSEI com maior nível de incidência correspondem a municipalidades de estados como Maranhão.
A Comissão registrou as informações aportadas pelo Estado e observou que teriam sido desenvolvidos nacionalmente diferentes planos de ação em favor dos povos indígenas, assim como ações pontuais que incidiriam em favor das pessoas beneficiárias. Não obstante, advertiu-se que os referidos planos têm caráter geral e/ou programático, sem que o Estado tenha esclarecido como estão sendo implementados em favor das pessoas beneficiárias e se são efetivos. Quanto a isso, observou-se que as informações apresentadas pelo Estado não permitiram desvirtuar o sustentado pela parte solicitante.
Em relação ao povo em isolamento voluntário Awá, o Estado alegou que receberiam atenção especial da Frente de Proteção Etnoambiental Awá. Contudo, não esclareceu como esta atenção estaria integrada à proteção dos povos indígenas considerando o cenário da pandemia de COVID-19 e a suposta presença de terceiros não autorizados nas proximidades das áreas ocupadas pelas pessoas indígenas Awá.
Ante o exposto pelas partes, frente à multiplicidade e à complexidade dos riscos alegados, considerando em particular que os povos indígenas no Brasil teriam historicamente apresentado vulnerabilidade imunológica a infecções respiratórias, não foram constatados elementos indicativos de que as ações estatais tenham sido suficientes e efetivas para proteger aos povos indígenas habitantes da TI Araribóia. Em consequência, de acordo com o Artigo 25 do Regulamento da CIDH, a Comissão solicitou ao Brasil que: adote as medidas necessárias para proteger os direitos à saúde, vida e integridade pessoal dos membros dos Povos Indígenas Guajajara e Awá da Terra Indígena Araribóia, implementando, a partir de uma perspectiva culturalmente adequada, medidas de prevenção quanto à disseminação de COVID-19, assim como lhes proporcionando uma atenção médica adequada em condições de disponibilidade, acessibilidade e qualidade, conforme os parâmetros internacionais aplicáveis; combine as medidas a serem adotadas com as pessoas beneficiárias e seus representantes; e informe sobre as ações implementadas voltadas à investigação dos fatos que deram lugar à adoção da presente medida cautelar e assim evitar a sua repetição.
A concessão da medida cautelar e sua adoção pelo Estado não constituem prejulgamento sobre uma eventual petição perante o sistema interamericano na qual sejam alegadas violações aos direitos protegidos na Convenção Americana e em outros instrumentos aplicáveis.
A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.
No. 009/21