Discursos

EMBAIXADORA VERA LÚCIA BARROUIN CRIVANO MACHADO, SUBSECRETÁRIA-GERAL POLÍTICA, MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES
DISCURSO DA CHEFE DA DELEGAÇÃO DO BRASIL

junho 7, 2011 - San Salvador, El Salvador


Senhora Presidenta,
Senhoras Ministras e Senhores Ministros,
Senhor Secretário Geral da OEA,
Senhoras e Senhores Chefes de Delegação,
Senhor Secretário Geral Adjunto,
Senhoras e Senhores Delegados,
Senhores Observadores Permanentes,
Senhoras e Senhores,

Em nome do Governo brasileiro, primeiramente, desejo expressar os agradecimentos ao povo e ao Governo de El Salvador, pela hospitalidade, pela cordial acolhida e pelo empenho na organização deste evento. A generosa oferta do Governo salvadorenho de sediar a 41ª Assembléia Geral da OEA constitui mais uma demonstração do compromisso deste país com o aprofundamento da cooperação nas Américas, objetivo plenamente compartilhado pelo Brasil.

Senhora Presidenta,

A OEA encontra-se em um momento de reafirmação de suas vocação e relevância para a promoção multilateral da paz e segurança regionais, a partir de uma visão renovada dos interesses de seus membros à luz dos desafios do século XXI. Os quatro pilares da Organização - democracia, direitos humanos, segurança e desenvolvimento – se apoiam mutuamente e têm por finalidade contemplar as expectativas e os objetivos da região diante de um cenário internacional complexo, que não pode prescindir do espaço de cooperação e diálogo, bem como do quadro jurídico e político oferecidos pela OEA.

O tema escolhido para esta Assembleia reflete a preocupação de nossos Governos e de nossas sociedades com o fenômeno da violência e da criminalidade, que aflige a todos, de diferentes formas e em diferentes medidas. Não por acaso, esse assunto esteve presente nos debates regionais de alto nível mais recentes, como a Cúpula das Américas de Port of Spain, que incluiu uma seção específica sobre segurança pública em sua Declaração final; as duas últimas Assembleias Gerais, que trataram, respectivamente, de "Uma Cultura da Paz e da Não-Violência", em São Pedro Sula; e de "Paz, Segurança e Cooperação nas Américas", em Lima.

Nossas sociedades enfrentam os desafios da insegurança, em suas mais distintas expressões. O tema central desta reunião – segurança cidadã – tem sido objeto de reflexão conjunta de nossos países em diferentes instâncias. No âmbito da OEA, o conceito de segurança multidimensional, consolidado na Conferência Especial sobre Segurança nas Américas, em 2003, contribuiu para atualizar o quadro conceitual da região sobre a matéria e para elevar o debate e a cooperação a novos patamares.

Senhora Presidenta,

O Brasil está comprometido com a manutenção e o aprofundamento da substantiva cooperação bilateral, sub-regional e regional em matéria de segurança pública em curso, a qual abrange, entre outros aspectos, atividades de fortalecimento de capacidades e intercâmbio de informações e experiências. Reiteramos nosso firme apoio aos foros técnicos criados para o acompanhamento e sistematização do tratamento dessas questões, cujo impacto sobre nossas sociedades é real e direto. Esses esforços, conquanto fundamentais para melhorias concretas das condições de segurança de nossos países, não devem deixar de respeitar as especificidades e as distintas prioridades dos países na matéria: não é possível aplicar fórmulas gerais a uma região tão rica e diversa como a nossa, seja em matéria de desenvolvimento, seja em matéria de segurança. O estabelecimento de vínculos automáticos entre crime transnacional e o crime comum e a violência interpessoal não leva em consideração aspectos importantes de nossas realidades.

A Declaração de São Salvador sobre Segurança Cidadã, que será adotada nesta Assembleia Geral da OEA, ressalta importante aspecto conceitual no tratamento da questão da violência e da insegurança na região ao reconhecer a relação estreita entre o desenvolvimento socioeconômico e a segurança. Sem promover o desenvolvimento integral de nossas sociedades, não é possível interromper o ciclo vicioso da violência, que rouba vidas, destrói famílias e impede a realização plena da cidadania.

A Presidenta Dilma Rousseff incluiu, dentre suas treze diretrizes de governo, a garantia da segurança dos cidadãos e o combate ao crime organizado. Pretende, justamente, consolidar a integração entre a repressão qualificada e inteligente ao crime e uma forte agenda social, voltada a grupos em situação de vulnerabilidade. No Brasil, o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (PRONASCI), iniciado em 2007, inaugurou uma ampla plataforma que soma o treinamento e equipamento das forças policiais e de inteligência a ações em áreas temáticas, como saúde, educação, direitos humanos, geração de trabalho e renda, promoção da igualdade, cultura e esporte, e acesso à justiça.

Na segunda metade do século passado, a despeito do crescimento econômico da região, a urbanização acelerada somada à concentração de renda e à falta de oportunidades contribuiu para a elevação do crime. Não basta a simples repressão. E tampouco basta apenas o crescimento econômico. É preciso enfrentar de maneira integral o fenômeno da violência e da criminalidade, por meio de ações articuladas nas esferas policial, judicial e social.

Senhora Presidenta,

Nesse contexto, reveste-se de especial significado a Carta Social das Américas, em negociação desde 2005 e que esperamos seja concluída em breve, complementando a Carta Democrática e resguardando os direitos dos cidadãos das Américas. Neste ano celebramos o décimo aniversário da Carta Democrática Interamericana, surpreende o fato de que a Carta Social das Américas permaneça pendente de aprovação e adoção, deixando uma grande lacuna no quadro normativo regional para a cooperação, que precisa ser sanada com urgência.

O Brasil permanece empenhado, ademais, nas negociações do projeto de Convenção Interamericana contra o Racismo e Toda Forma de Discriminação Racial e Intolerância. Vemos com satisfação a adesão, de grande número de países, à proposta de Antígua e Barbuda de que seja negociado um projeto de Convenção sobre o tema da discriminação racial e um ou mais protocolos adicionais. A discriminação, de qualquer natureza, e a exclusão constituem mecanismos cruéis de denegação da cidadania e dos direitos humanos mais elementares a parcelas de nossas sociedades. É preciso garantir às minorias e às populações em situação de vulnerabilidade o acesso a modelos inclusivos de desenvolvimento.

Senhora Presidenta,

Segurança Cidadã também se refere ao respeito aos direitos humanos e ao acesso à justiça. O Estado Democrático de Direito deve ser capaz de respeitar e garantir os direitos de seus cidadãos, sejam eles vítimas ou agentes do crime. Deve combater a impunidade, a violência policial e outras ameaças aos direitos fundamentais da pessoa humana. Neste contexto, destaco o comprometimento da região com a cooperação na área judicial, em particular no âmbito da Reunião de Ministros da Justiça das Américas, cuja oitava edição realizou-se em Brasília, em fevereiro de 2010, e da Reunião de Ministros e Autoridades em Segurança Pública.

O Brasil tem também reiterado seu apoio ao sistema interamericano de direitos humanos. A universalização do sistema é condição fundamental para o seu fortalecimento, na medida em que, enquanto persistirem diferentes graus de obrigações jurídicas e de inserção nos instrumentos regionais, resta comprometido o objetivo primordial de assegurar proteção aos direitos humanos nas Américas.

O respeito aos direitos humanos passa pelos esforços que empreendam os Estados e pela atuação diligente e cuidadosa dos órgãos principais que compõem o Sistema Interamericano – a Corte e a Comissão. É necessário que estes empreendam seu curso de ação com base na apuração acurada sobre os casos que são levados a seu conhecimento. O Brasil espera que o sistema interamericano continue a se aperfeiçoar para que possa ampliar o grau de confiança da sociedade e dos governos da região e assim contribuir de forma efetiva para o aprimoramento de nossas instituições, nossos respectivos sistemas jurídicos e nossas relações humanas.

Senhora Presidenta,

Gostaria de saudar o diálogo atualmente em curso no âmbito do Conselho Permanente sobre a eficácia da aplicação da Carta Democrática Interamericana, que em setembro deste ano comemora seu décimo aniversário. Nossa região vivencia momento particularmente importante de renovação política e de reafirmação dos ideais democráticos. Congratulo-me com a sociedade haitiana, que superou as incertezas e os sobressaltos que envolveram o início do processo eleitoral naquele país. Felicito o Presidente Michel Martelly por sua eleição. Permito-me reiterar aqui o apoio brasileiro aos esforços de reconstrução do país. Manifesto, ainda, apreço ao relevante papel da OEA no processo de recuperação da estabilidade política e fortalecimento institucional do Haiti.

O Brasil acolheu com grande satisfação o retorno de Honduras às atividades da OEA. Após quase dois anos de processo de normalização política, foi possível alcançar um acordo de reconciliação nacional, impulsionado pela habilidade diplomática da Colômbia e da Venezuela, que permitiu o regresso do ex-Presidente Zelaya àquele país, com reconhecimento pleno de seus direitos, incluindo o exercício de sua ação política em condições de segurança e liberdade. Foi fundamental, nesse contexto, o compromisso do Presidente Porfírio Lobo em fomentar o diálogo político interno. O retorno de Honduras à OEA constitui verdadeiro marco na história do sistema interamericano de proteção e promoção da democracia. Não posso deixar de registrar aqui o reconhecimento do papel desempenhado pela Organização nas negociações para a normalização da situação daquele país, assim como os esforços ingentes do Secretário-Geral José Miguel Insulza.

Senhora Presidenta,

O Brasil reitera seu compromisso com a transformação das Américas em um espaço de paz, estabilidade e prosperidade. O desafio de nossos países será superar, com equilíbrio e por meio da cooperação solidária e do intercâmbio de experiências, tanto a expressão da violência quanto suas causas mais profundas relacionadas com a necessidade de promover o desenvolvimento sustentável com justiça social.

Muito obrigada.