Imprensa da CIDH
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Washington, D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) expressa seu mais profundo repúdio contra a decisão do Secretário Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luís Almagro, de não avançar no processo de renovação do mandato de seu Secretário Executivo, bem como seu alarme diante de um sério ataque contra sua independência e autonomia.
No exercício das suas atribuições, em 27 de julho de 2016, a CIDH selecionou Paulo Abrão, após um extenso processo, para o cargo de Secretário Executivo e, de acordo com os termos do artigo 11 de seu Regulamento, encaminhou seu nome ao Secretário Geral, Luís Almagro, que confirmou a seleção e o nomeou para o cargo, assumindo-o em 16 de agosto do mesmo ano.
No exercício dessas mesmas atribuições, a Comissão Interamericana, durante sessão realizada no México de 8 a 9 de janeiro de 2020, decidiu por unanimidade renovar o mandato de seu Secretário Executivo para o período 2020-2024, tornando tal decisão pública por meio de comunicado 5/20 de imprensa publicado em 9 de janeiro de 2020. Para fins de sua contratação administrativa, no mesmo 9 de janeiro, o Secretário Geral foi notificado por nota oficial "de acordo com o Artigo 11, parágrafo 3, do Regulamento Interno da Comissão". Uma das razões da decisão da Comissão Interamericana para renovar o mandato do atual Secretário Executivo e reiterar sua confiança nele foi a necessidade de contar um Secretário Executivo que tenha condições e capacidade para consolidar um processo de transformação e modernização do trabalho da Comissão. Alguém que possa liderar o processo de conclusão de seu Plano Estratégico 2017-2021, bem como a construção de seu novo plano para o futuro, de acordo com sua visão para a proteção dos direitos humanos na região.
Em 15 de agosto de 2020, último dia da vigência contratual, o Secretário Geral da OEA informou à CIDH, sem consulta prévia, sua decisão de não "avançar no processo de nomeação do Secretário Executivo" da CIDH. Na prática, essa decisão se traduz em uma recusa de prorrogação do contrato de trabalho, procedimento necessário para dar continuidade administrativa ao mandato do Secretário Executivo. A Comissão anuncia à comunidade internacional que esta decisão unilateral do Secretário Geral constitui um flagrante desrespeito à sua independência e autonomia, buscando a separação de fato do Secretário Executivo, e anular a decisão de renovação adotada 8 meses antes pela CIDH. Chama a atenção da Comissão o fato de que durante este período não recebeu nenhum questionamento do Secretário Geral sobre a validade do procedimento de renovação.
A Comissão ressalta que em sua comunicação, recebida no último dia do primeiro mandato do Secretário Executivo, o Secretário Geral citou dois relatórios como base para sua decisão: um preparado pela Secretaria de Assuntos Jurídicos da Secretaria Geral da OEA sobre os poderes do Secretário Geral em relação ao processo de nomeação do Secretário Executivo e o procedimento de preparação de propostas da CIDH, e o outro elaborado pela Ombudsperson da OEA, alertando sobre a natureza confidencial de seu conteúdo.
A este respeito, a CIDH observa com extrema preocupação a interpretação das normas apresentadas no relatório jurídico no qual o Secretário Geral baseia sua decisão, segundo as quais o Regulamento Interno da CIDH é uma mera interpretação não vinculativa do Estatuto da Comissão e da Carta da OEA e que, portanto, o Secretário Geral não é obrigado a cumpri-las. Esta interpretação também ignora a regra e a prática atual que tem sido consistentemente mantida desde 2000 e aplicada tanto em 2012 quanto em 2016 para a seleção e nomeação dos dois últimos Secretários Executivos e também para a última renovação do Relator Especial Edson Lanza em 2017 e da Relatora Especial DESCA, Soledad Garcia em 2020. Da mesma forma, a interpretação das normas referidas pelo Secretário Geral é contrária à opinião da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que estabeleceu que a CIDH "como órgão do sistema interamericano de proteção dos direitos humanos, tem plena autonomia e independência no exercício de seu mandato nos termos da Convenção Americana de Direitos Humanos".
Nesse sentido, interpretando que a Comissão não é o órgão autorizado para a seleção e renovação do Secretário Executivo, o relatório jurídico ignora não somente a Carta da OEA que criou a Comissão Interamericana de Direitos Humanos como órgão principal da Organização junto com a Secretaria Geral, que é autônoma e independente. Adicionalmente, o próprio Estatuto da CIDH, aprovado pela Assembleia Geral, também confia à Comissão Interamericana a adoção de seu próprio Regulamento Interno. Em virtude deste mandato, a CIDH adotou uma série de Regras de Procedimento, que são obrigatórias de acordo com as disposições previstas no Estatuto, em seu artigo 25. O relatório também não indica que, como salvaguarda da autonomia da CIDH, o Estatuto estabelece que para que o Secretário Geral possa proceder com a separação do Secretário Executivo da Comissão, ele deve primeiro consultar a Comissão e informá-la das razões de sua decisão.
Dado que o poder de nomear e retirar pessoal de confiança de suas funções é indispensável para que a Comissão cumpra seu mandato de supervisão e promoção dos direitos humanos no Hemisfério, as normas sobre as quais o sistema interamericano de direitos humanos foi construído respondem à necessidade de salvaguardar suas competências e autonomia institucional, de modo que os atores externos não possam determinar quem ocupa esses cargos, muito menos quando eles devem ser destituídos do cargo.
Além disso, a Comissão salienta que esta grave situação ocorre em um contexto no qual a Secretaria Geral impôs restrições à execução do Fundo Regular 2020 que têm um impacto desproporcional sobre a CIDH. De fato, até hoje não recebeu a totalidade dos recursos aprovados pela Assembleia Geral que necessita para seu adequado funcionamento. Este montante é parte do aumento de recursos para o Sistema Interamericano de Direitos Humanos aprovado pela Assembleia Geral da OEA em Cancun, em 2017. Além disso, tende a enfraquecer a CIDH no momento em que começam as discussões sobre o orçamento da Organização para 2021.
Ao longo de seus 61 anos de história na defesa dos direitos humanos, a autonomia e independência da Comissão Interamericana foram fortalecidas e defendidas a todo custo como um dos pilares centrais da legitimidade pelos Estados membros, pela sociedade civil e pelas vítimas de violações dos direitos humanos. De fato, desde 2000, a Comissão havia feito progressos significativos em direção a uma maior autonomia administrativa, em um processo de diálogo e coordenação com os sucessivos Secretários Gerais, incluindo o próprio Secretário Almagro que, em 2016, confirmou a seleção do atual Secretário Executivo e o nomeou para o cargo por um mandato de quatro anos, em conformidade com as Regras de Procedimento da CIDH. Esta não é a primeira vez que o Sistema Interamericano de Direitos Humanos enfrenta estes ataques. Entretanto, grandes avanços nas normas interamericanas não teriam sido alcançados se a Comissão não tivesse exercido plenamente sua autonomia e independência.
Graças a sua autonomia e independência reforçadas, a CIDH realiza seu trabalho de forma imparcial, livre de qualquer influência política e é um exemplo e uma referência para o mundo. A interpretação jurídica que a CIDH usou para decidir por unanimidade pela renovação do Secretário Executivo se baseia no marco jurídico interamericano atual e anterior, bem como no compromisso da Secretaria Geral "de alcançar maior autonomia técnica e administrativa para a Comissão", conforme estabelecido na Diretiva D-1/2000.
Deve-se lembrar que no passado esta discussão já foi levantada e resolvida em diálogo com todos os atores relevantes no hemisfério, incluindo o Secretário Geral, nos termos do Regulamento Interno da CIDH. A Comissão espera que, nesta ocasião, esta grave situação possa ser superada por meio do diálogo.
Com relação ao relatório confidencial da Ombudsperson sobre a situação da Secretaria Executiva em 2019, notificado à Comissão em 10 de agosto de 2020, a CIDH, como órgão principal da OEA responsável pela promoção e proteção dos direitos humanos nas Américas, atribui a ela a maior importância e, para tanto, solicita que seja conhecida e processada com os mais altos padrões de devido processo, dever de investigação e devida diligência.
A CIDH informa que ao longo de 2019 deu a máxima atenção ao assunto e acompanhou cada uma das situações e as medidas adotadas para atende-las. Ao mesmo tempo, a Comissão está profundamente surpresa que apesar de que estas situações se refiram a 2019, a Ombudsperson tenha esperado até 5 dias antes da expiração do contrato do Secretário Executivo para transmiti-las. Tanto a Comissão quanto seu Secretário Executivo, com devida diligência e seriedade, forneceram à Ombudsperson amplas informações e receberam abertamente sugestões sobre as situações que ela levantou e ressalta que a grande maioria das quais foram implementadas, conforme registrado em um relatório detalhado apresentado ao Secretário Geral em 14 de agosto. Ao mesmo tempo, a Comissão reitera sua total disponibilidade para cooperar com a Secretaria Geral na abordagem das novas situações que só agora foram levadas ao seu conhecimento. Afirma que as processará a fim de reafirmar a prioridade dada às necessidades do pessoal da Secretaria Executiva e, em particular, o bem-estar, a estabilidade e o desenvolvimento profissional de todo o pessoal. A CIDH também enfatiza sua firme posição sobre a necessidade de abordar cada uma das situações levantadas, de levar em conta e verificar todos os aspectos que fazem parte desse processo, com pleno respeito às garantias do devido processo e ao princípio da presunção de inocência, bem como de considerar a implementação de todas as medidas que foram tomadas dentro da Secretaria Executiva da CIDH ao longo do ano de 2019 e que foram devidamente transferidas para a Secretaria Geral através de um relatório preparado pelo Secretário Executivo. No entanto, a CIDH reitera que o Secretário Executivo é um funcionário de sua confiança.
Neste sentido, é inadmissível que se tente usar um relatório institucional confidencial da Ombudsperson ou informações de que uma investigação administrativa está sendo iniciada como base para uma decisão sobre a não renovação administrativa do Secretário Executivo da CIDH, em clara violação às reiteradas normas do Sistema. A CIDH recorda a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos segundo a qual as garantias do devido processo estabelecidas no artigo 8 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos são aplicáveis a todos os processos, inclusive os administrativos. Em particular, ressalta os princípios da presunção de inocência e da imparcialidade da autoridade competente para que as pessoas estejam em condições de defender adequadamente seus direitos perante qualquer tipo de ato que possa afetá-las, seja de natureza administrativa ou disciplinar.
Nesta ocasião, a CIDH destaca, apoia, reconhece e agradece o trabalho
realizado pelo Secretário Abrão durante estes últimos 4 anos, a quem
reafirma sua confiança e reitera sua decisão unânime de renovar seu mandato,
solicitando ao Secretário Geral que dê continuidade ao processo
administrativo de extensão contratual do mandato do Secretário Executivo. De
fato, graças à sua liderança, a Comissão conseguiu fortalecer um acesso à
justiça interamericana mais eficaz e acessível para as vítimas de violações
de direitos humanos nas Américas, o monitoramento integrado e oportuno e o
fortalecimento das ações de cooperação técnica. Os resultados podem ser
acompanhados de relatórios de progresso sobre a implementação do Plano
Estratégico 2017-2021 e outros:
extensão da estrutura em 2017;
balanço de
mecanismos especiais de
acompanhamento em 2018;resultados
das
etapas
do programa para superar
atrasos processuais em 2019;
2019;
balanço da
SACROI COVID-19;
balanço parcial de 2020.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos rejeita qualquer tipo
de interferência no exercício de seu mandato e, em particular, com seu
poder de eleger, renovar e demitir seus funcionários de confiança. A
CIDH também adverte sobre o não cumprimento do compromisso assumido em
Cancun em relação à terceira etapa da duplicação do orçamento aprovado
pela Assembleia Geral e pede que não se retire das capacidades do
Sistema Interamericano de Direitos Humanos para proteger e defender os
direitos humanos. A Comissão faz seu mais forte apelo à defesa e ao
respeito por esses poderes, que são indispensáveis para que ela cumpra
seu mandato livre de qualquer pressão ou interferência que possa
procurar limitar o escopo das tarefas de defesa, monitoramento e
promoção dos direitos humanos no Hemisfério de forma independente e
autônoma. Finalmente, a CIDH reitera seu voto de confiança na renovação do
mandato do Secretário Executivo, expressando sua disposição de dialogar
com o Secretário Geral e todos os órgãos da OEA a fim de alcançar uma
solução que respeite a autonomia e a independência da Comissão. A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência. No. 202/20