CIDH

Comunicado de Imprensa

Diante da persistência de limitações a protestos, a CIDH solicita veementemente o cumprimento com a implementação dos acordos alcançados na Nicarágua

30 abril de 2019

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Washington D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) expressa a sua preocupação pela persistência das restrições ao exercício de protestos sociais da população nicaraguense e da repressão aos que querem que suas vozes sejam escutadas, mais de um ano após iniciada a crise na Nicarágua. Neste contexto, a Comissão solicita que o Estado da Nicarágua cumpra urgentemente com a implementação dos acordos alcançados no diálogo sobre a liberação de todas as pessoas privadas de liberdade no contexto da crise e o restabelecimento de direitos e garantias.

Em seu trabalho de monitoramento, através do MESENI, a CIDH vem observando recentemente novas formas de repressão contra manifestantes que se caracterizam por detenções por períodos breves de pessoas que não são levadas a cadeias policiais. Estas resultam de medidas dissuasivas dos protestos, como a vigilância policial massiva e permanente de todos os espaços públicos onde manifestações poderiam ser realizadas. Segundo as informações recebidas, a marcha convocada pela Unidade Nacional Azul e Branco para o dia 17 de abril, um ano depois do início da crise, foi impedida pela ação policial mediante a detenção breve de 68 pessoas. Segundo informações ao alcance da CIDH, essas pessoas foram submetidas a maus tratos dentro de unidades móveis, para logo serem liberadas em outras zonas da cidade. Segundo informação de conhecimento público, a Polícia teria proibido a referida manifestação antecipadamente através de um comunicado público; e adicionalmente, mediante nota à imprensa, a Polícia haveria negado que ocorreram detenções durante essa jornada.

Além disso, o MESENI tomou conhecimento da denúncia sobre a detenção do jornalista Abixael Mogollón, do meio digital Artículo 66, enquanto cobria ao vivo a convocação da marcha do último dia 17 de abril, em Manágua. Esse jornalista foi detido por agentes antimotins da polícia junto com quatro mulheres. Todas as pessoas detidas teriam sofrido agressões com pés, punhos e cassetetes, mediante grave ameaça para dissuadi-los de participar das marchas, e tiveram todos os seus pertences confiscados, incluindo o equipamento profissional. No caso das 4 mulheres, elas teriam sido submetidas a atos de violência sexual mediante toques inapropriados. Estes maus tratos e degradantes teriam ocorrido dentro de um micro-ônibus policial na zona em que foram detidos, e as pessoas teriam sido soltas posteriormente em outro lugar.

Há mais de um ano a CIDH vem documentando uma série de crimes cometidos pelo Estado da Nicarágua, no contexto de um ataque generalizado e sistemático contra a população civil, que segundo o GIEI-Nicarágua, devem ser considerados crimes contra a humanidade. Diante das diferentes modalidades de repressão a manifestações ocorridas no país, caracterizadas pelo uso excessivo da força por agentes estatais e parapoliciais; execuções extrajudiciais; violações massivas contra a integridade pessoal; detenção arbitrária; criminalização dos protestos; demissões, ameaças e perseguições; extinção da personalidade jurídica de organizações civis, que obrigou dezenas de milhares de pessoas ao deslocamento forçado interno e a buscar proteção internacional em outros países; a Comissão registrou e documentou que as pessoas manifestantes variaram e limitaram suas formas de protestar. A CIDH tomou conhecimento da multiplicação, durante março e abril últimos, de piquetes expressos; breves atos de protesto em lugares privados; apitaços; sentadas ou plantões breves; lançamento de papel picado ou canudinhos e marcas de tinta sobre as ruas com as cores nacionais.

Neste contexto, segundo informações públicas, a CIDH recebeu a notícia da detenção de Tamara Dávila, ocorrida em 9 de abril no departamento de Carazo. Na frente de seus filhos de 16, 9 e 4 anos, Tamara Dávila teria sido presa e transferida à delegacia de Jinotepe, departamento de Carazo, até 12 de abril, quando foi liberada. Versões públicas indicam que o motivo de sua detenção teria sido espalhar canudinhos azul e branco na rua. Seguindo o mesmo padrão, a CIDH tomou conhecimento da detenção de um grupo de adolescentes por policiais, ocorrida em 19 de abril em Manágua, porque aqueles pretendiam realizar um “piquete expresso”. A maioria do grupo teria sido liberada dois dias depois e um deles, de 17 anos, teria sido indiciado por posse ilegal de armas.

A CIDH reitera o chamado feito ao Estado da Nicarágua para respeitar o direito de protestos sociais, que é uma das formas de exercício do direito de reunião e da liberdade de expressão. A Comissão recorda que a proteção do direito de reunião inclui não somente a obrigação do Estado de não interferir com seu exercício, mas também a obrigação de adotar, em certas circunstâncias, medidas positivas para assegurá-lo, por exemplo, protegendo os participantes de uma manifestação da violência física de pessoas que possam ter opiniões divergentes.

“Reiteramos nossa recomendação de que o Estado da Nicarágua restabeleça as garantias e liberdades no país. O livre exercício dos direitos humanos, inclusive em contextos conflituosos, é um insumo para avançar em direção a soluções pacíficas e estáveis,” observou a Comissária Antonia Urrejola, Relatora da CIDH para a Nicarágua.

Por outro lado, ainda que a CIDH reconheça o avanço que significam os acordos publicados em 27 e 29 de março de 2019, no marco do diálogo entre o Governo e a Aliança Cívica pela Justiça e Democracia na Nicarágua, a Comissão observa que, segundo estatísticas oficiais, somente foram postas em liberdade 236 pessoas privadas de liberdade no contexto da crise. No entanto, segundo informações proporcionadas por organizações da sociedade civil, são pelo menos 700 as pessoas acusadas em ações penais, muitas das quais permanecem privadas de liberdade. Além disso, a CIDH nota que as pessoas liberadas continuam em sua maioria criminalizadas sob graves acusações em processos sem garantias judiciais, e sem informações sobre a situação jurídica em que se baseou a sua liberação. Nestes casos, as pessoas teriam sido colocadas em liberdade por decisão unilateral do Estado, sem apego aos termos e acordos produzidos pelo diálogo. Do mesmo modo, segundo as informações recebidas, as pessoas liberadas estariam sendo submetidas a assédio, vigilância, novas detenções, e inclusive a apresentação de novas denúncias penais contra as mesmas, desta vez também por crimes comuns, como narcotráfico, contravenções associadas a rixas, e roubo.

No referido contexto, a CIDH solicita com urgência o cumprimento dos acordos, especialmente no que diz respeito à imediata liberação das pessoas que permanecem recluídas no contexto da crise, conforme protocolos claros estabelecidos. Igualmente, requer que seja garantido o respeito de seus direitos, particularmente de não ser submetido a maus tratos ou condições degradantes, razão pela qual se deve melhorar imediatamente as condições penitenciárias, enquanto as pessoas não são libertadas. Sobre esse tema, a CIDH toma nota que, de acordo com informações públicas, desde 22 de março, as pessoas presas na prisão La Modelo não dispõem de energia elétrica e o seu acesso à água vem sendo racionado.

“São especialmente preocupantes para a CIDH as condições de detenção em que se encontram as pessoas presas nas prisões da Nicarágua no marco da crise enfrentada pelo país,” indicou o Relator sobre os Direitos das Pessoas Privadas de Liberdade, Joel Hernández. “O Estado deve adotar as medidas necessárias para cumprir com o seu compromisso de devolver a liberdade a estas pessoas”, acrescentou.

A CIDH recebeu informações relacionadas com o interesse de pessoas nicaraguenses que fugiram do país de regressar ao mesmo. Neste contexto, a Comissão solicita que o Estado concretize um plano para garantir a proteção dos direitos à vida, integridade pessoal, e a proibição da tortura e da privação arbitrária da liberdade daquelas. O retorno destas pessoas só deverá ser realizado após o Estado oferecer garantias reais de que estas não estarão em risco de violações a direitos humanos, e de que seu retorno será garantido em condições de segurança, dignidade e livre de perseguições.

A CIDH, a partir de seu trabalho cotidiano de monitoramento e acompanhamento da situação de direitos humanos na Nicarágua, expressa mais uma vez a sua total e imediata disposição em colaborar e fornecer a assistência técnica necessária para contribuir ao restabelecimento da plena vigência dos direitos humanos no país, em cumprimento de seu mandato, inclusive através do seu retorno ao país. A Comissão recorda novamente ao Estado da Nicarágua da sua obrigação de manter e publicar informações fidedignas sobre as vítimas da crise, tais como pessoas presas e falecidas. Adicionalmente, reitera a permanente disposição da CIDH para cotejar essa informação com a obtida diretamente pelo MESENI.

A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.

 

No. 108/19