A CIDH apresenta caso sobre a Argentina perante a Corte Interamericana

10 de março de 2021

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Washington, D.C.- A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) apresentou no dia 25 de fevereiro de 2021 perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) o caso Cristina Britez Arce e família, a respeito da Argentina. O caso se refere à responsabilidade internacional da Argentina pelos atos relacionados com a morte de Cristina Brítez Arce e a ausência da devida diligência na investigação e nos processos judiciais que se realizaram a esse respeito.

Cristina Brítez Arce, que estava grávida de nove meses, apresentou-se ao Hospital Público Sardá em 1992 alegando desconforto lombar, febre e uma pequena perda de líquido pelos genitais. Foi então realizada uma ultrassonografia que indicou que o feto estava morto, razão pela qual ela foi internada para ter o parto induzido. Segundo o certificado de óbito, a vítima faleceu nesse mesmo dia por "parada cardiorrespiratória não traumática". 

Em seu Relatório de Mérito, a Comissão indicou que não lhe correspondia determinar qual foi a causa da morte da senhora Brítez. Adicionalmente, apontou que tampouco devia avaliar as perícias realizadas a nível interno, mas sim estabelecer se o Estado atuou de maneira diligente e fez o que razoavelmente era esperado para proteger os direitos da Cristina Brítez e prevenir sua morte, em conformidade com as suas obrigações internacionais. Neste sentido, considerou-se ao analisar o caso que deveria ter-se levado em consideração a condição de gravidez, o tratamento e óbito em um hospital público, bem como os deveres especiais do Estado decorrentes dessa condição, de forma que o Estado poderia demonstrar que forneceu cuidados de saúde abrangentes e adequados.

A CIDH concluiu que os médicos não agiram de maneira diligente para assegurar os direitos à saúde, vida e integridade física da vítima. Em primeiro lugar, observou-se que o Estado não demonstrou que tenha proporcionado à senhora Britez informação ou recomendações específicas de cuidado para prevenir um quadro de hipertensão, mesmo tendo conhecimento de seu histórico de pré-eclâmpsia.

Em segundo lugar, a Comissão advertiu a existência de pelo menos dois fatores de risco importantes que não foram contestados e que os médicos que trataram da vítima durante os seus exames deveriam ter levado em consideração. São estes o aumento expressivo de peso e os antecedentes de pré-eclâmpsia em uma gravidez anterior. Somou-se a isto o fato de que, em um de seus exames, a senhora Britez apresentou pressão arterial de 130/90, o que segundo os parâmetros da Organização Mundial da Saúde pode indicar pré-eclâmpsia. Em terceiro lugar, observou-se que a causa da morte poderia ter sido pré-eclâmpsia não diagnosticada ou não tratada, e que não foi realizado um controle exaustivo com base nas técnicas requeridas que não eram de natureza complexa. Isso, apesar de tratar-se de uma gravidez de alto risco.

Adicionalmente, a CIDH observou que a atenção fornecida à vítima foi determinada por alguns peritos como "péssima", os quais apontaram que "houve uma má gestão da situação da mulher, o que derivou na morte do feto". Além disso, a CIDH teve conhecimento de que a senhora Britez nos momentos anteriores a sua morte teria sido sujeita a uma situação de angústia e estresse.

Finalmente, como quarto ponto, a Comissão estabeleceu que a investigação também não permitiu justificar que os médicos tenham agido de forma adequada, de acordo com as circunstâncias específicas que o estado e o desenvolvimento da gravidez justificavam. Nesse sentido, as perícias praticadas nesta matéria e as referências explícitas nelas contidas relativas ao fato de a atenção prestada não ter sido adequada não resultaram desvirtuadas.

Diante do exposto anteriormente, a CIDH concluiu que o Estado argentino não demonstrou ter agido de maneira diligente e adotado as medidas que eram razoavelmente requeridas para salvaguardar os direitos da vítima. Tais omissões se verificaram a pesar do dever especial que o Estado tinha de proteger os direitos da senhora Britez em sua condição de mulher gestante, que como foi indicado, requer a adoção de medidas específicas em razão de sua condição de mulher e situação de gravidez.

Por outro lado, a Comissão destacou que, nas diversas instâncias judiciais, assim como nas perícias realizadas, enfatizou-se a impossibilidade de conhecer com certeza a causa da morte, dado que a autopsia não foi realizada imediatamente após a vítima vir a óbito. Além disso, as decisões a nível interno, tanto no âmbito penal quanto no âmbito civil, estiveram baseadas principalmente no resultado das perícias que foram realizadas com a informação contida no prontuário médico. A Comissão observou a este respeito que os familiares da senhora Britez questionaram a validade do referido prontuário em diversas ocasiões, informando, detalhadamente, que apresentava evidências de ter sido adulterado. Não obstante, a Comissão não constatou a existência de qualquer linha de investigação especificamente destinada a esclarecer efetivamente se o prontuário estava adulterado ou não, mesmo sendo essa uma prova relevante dado que foi a base das perícias e, posteriormente, das decisões judiciais nas quais se considerou não contar com elementos suficientes para determinar responsabilidades pela morte da senhora Cristina Britez Arce. A Comissão advertiu também que os processos penal e civil não foram realizados dentro de um prazo razoável.

Finalmente, em razão do sofrimento e falta de certeza sobre a causa do óbito, assim como da demora nas investigações, a Comissão considerou que o Estado violou o direito à integridade pessoal dos familiares da senhora Britez Arce. 

Em base a tudo o que foi colocado, a Comissão concluiu que o Estado é responsável pela violação dos direitos consagrados nos artigos 4.1 (vida), 5.1 (integridade física), 8.1 (garantias judiciais), 25.1 (proteção judicial) e 26 (saúde), da Convenção Americana, em relação com as obrigações estabelecidas no artigo 1.1 do mesmo instrumento, assim como pela violação do artigo 7 (deveres dos Estados) da Convenção de Belém Do Pará. Adicionalmente, a CIDH concluiu a responsabilidade do Estado da Argentina por uma violação à integridade física do filho e da filha de Cristina Britez Arce. 

Em seu Relatório de Mérito a Comissão recomendou ao Estado: 

1. Reparar integralmente as violações de direitos humanos declaradas no relatório de mérito tanto no aspecto material como no imaterial. O Estado deverá adotar as medidas de compensação econômica e satisfação em favor dos familiares da vítima, identificados no relatório de mérito.

2. Providenciar as medidas de atenção em saúde mental que Ezequiel Martín e Vanina Verónica Avaro requererem, caso seja essa a sua vontade e de forma acordada.

3. Providenciar as medidas de capacitação necessárias, com o fim de que os/as trabalhadores/as da saúde que atendam mulheres grávidas e/ou em situação de parto, tanto em hospitais públicos quanto privados, conheçam os estândares estabelecidos no relatório.

A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.

No. 057/21